Uma carta datada do dia 15 de maio de 1995 e assinada pelo então governador de Pernambuco, Miguel Arraes, já alertava para os riscos da privatização da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf).
Endereçada ao presidente da República à época, Fernando Henrique Cardoso, Arraes se posicionou contrário ao decreto do governo federal que trazia a decisão de privatizar a subsidiária da Eletrobras.
Na carta, o governador de Pernambuco disse que a perda do controle da estatal significaria, na prática, privatizar o único rio grande e perene do Nordeste, responsável por exercer inestimável papel social na região.
“A venda da Chesf, a maior das 22 empresas do sistema Eletrobras, pode colocar em risco outros usos da água. O elemento principal não são as máquinas nem as barragens. É a água do rio, que já é escassa, e disputada pela energia, pela irrigação e também pelas áreas secas de Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande Norte”, escreveu Arraes.
Se as usinas e a própria empresa tinham algum valor de mercado, “valioso mesmo era o rio que as alimentava”, destacou o socialista.
“Deve-se partir da constatação de que o governo federal está vendendo o rio São Francisco, dito de integração nacional. O Velho Chico vai de cambulhada na privatização da Chesf, que não vive sem ele”.
Arraes desacreditava que grupos privados estivessem dispostos a fazer investimentos no rio, como tentava justificar o governo para levar adiante a privatização, “numa época em que o jogo financeiro mostra-se mais rentável que o próprio setor produtivo”.
Para Arraes, as medidas que seriam adotadas “por motivos circunstanciais” para promover a venda da companhia visavam apenas atender aos “ditames do sistema financeiro”.
“Devemos reconhecer a utilidade dos recursos internacionais. Entretanto, a destinação desses recursos visa apenas atenuar, e não deter, o crescente empobrecimento que nos impõem as circunstâncias e que nos colocam no caminho de uma subordinação contra a qual sempre lutamos”, avaliou.
Arraes disse ainda no texto que as privatizações no país ocorriam sempre no sentido de os monopólios privados “se apoderarem do que já está construído e consolidado”, nunca para novas iniciativas.
Para o socialista, o papel da iniciativa privada “jamais” seria o de resolver problemas sociais e corrigir diferenças regionais.
No mesmo ano em que escreveu a carta, o governo de Fernando Henrique Cardoso recuou da decisão de privatizar a estatal.
Leia a íntegra da carta de Miguel Arraes aqui.