
“Dom Hélder é nosso patrono em toda a luta pacífica pela justiça, pela paz e pelos direitos humanos”, afirma Dom Antônio Fernando Saburido, arcebispo de Olinda e Recife.
O arcebispo de Olinda e Recife, Dom Hélder Câmara, foi declarado o patrono brasileiro dos direitos humanos. A lei que concede o título ao líder religioso foi publicada no Diário Oficial da União após sanção do presidente Michel Temer.
Nomeado arcebispo de Olinda e Recife em 1964, Dom Hélder tornou-se ícone da resistência contra a ditadura militar, tendo lutado contra o autoritarismo e os abusos praticados durante o período. Dom Hélder faleceu em 1999 no Recife.
Em carta, o atual arcebispo de Olinda e Recife, Antônio Fernando Saburido, elogiou o título, mas criticou o fato de a nomeação partir de um governo marcado por impor retrocessos aos direitos humanos.
“Como arcebispo de Olinda e Recife, ministério que foi ocupado por Dom Hélder Câmara, sinto-me, em consciência, obrigado a declarar publicamente que esse decreto presidencial, para ser sincero e coerente, precisa ser acompanhado por outro modo de governar o país e de cuidar do que é público, principalmente do bem maior que é o povo, sobretudo os mais fragilizados”, afirmou Saburido.
O arcebispo disse que foi surpreendido pela “ambiguidade” da lei. “O que significa essa medida vir de um governo que justamente esvaziou a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e comprometeu todo o trabalho que vinha sendo feito na luta contra todo tipo de discriminações?”, questionou.
“Será que nomear Dom Hélder patrono brasileiro dos direitos humanos fará o governo voltar atrás da decisão de reduzir substancialmente os gastos públicos em saúde e educação, deixando os milhões de pobres abandonados à própria sorte?”, indagou o arcebispo.
Saburido criticou ainda o retrocesso do governo Temer no controle ao trabalho escravo, nas novas regras trabalhistas e na proposta de reforma da Previdência.

Dom Hélder Câmara e Miguel Arraes. Foto: Instituto Miguel Arraes
“Como pensar em Direitos Humanos e relaxar as regras do controle ao trabalho escravo, assim como sujeitar os trabalhadores a regras que lhes são contrárias e que retiram direitos adquiridos na Constituição de 1988? E o que dizer da reforma da Previdência Social pela qual esse mesmo governo pressiona de formas ilícitas para vê-la aprovada?”, interroga.
Dom Hélder Câmara foi o único brasileiro indicado quatro vezes para o Prêmio Nobel da Paz e foi também um dos fundadores da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Nascido em 7 de fevereiro de 1909, em Fortaleza, Dom Hélder foi ordenado padre em 1931. Além de atuar como bispo-auxiliar no Rio de Janeiro, o líder religioso foi arcebispo de Olinda e Recife entre 1964 e 1985.
Leia a íntegra da carta do arcebispo de Olinda e Recife, Dom Fernando Antônio Saburido:
“Felizes sereis quando os homens vos odiarem, expulsarem, insultarem e amaldiçoarem o vosso nome por causa do Filho do Homem. (…) pois era assim que os seus antepassados tratavam os profetas. (…) Ai de vós quando todos falarem bem de vós, pois era assim que seus antepassados tratavam os falsos profetas” (Lc 6, 22- 23 e 26).
Queridos irmãos e irmãs de nossa arquidiocese,
Todos nós fomos surpreendidos pela Lei n. 13581, de 26 de dezembro de 2017, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente da República Michel Temer. Declara Dom Hélder Câmara patrono brasileiro dos direitos humanos.
Todos os brasileiros conscientes e que amam a justiça e o direito concordam que Dom Hélder é nosso patrono em toda a luta pacífica pela justiça, pela paz e pelos direitos humanos, tanto individuais, como coletivos das minorias fragilizadas pela sociedade dominante. No entanto, nos surpreendemos pela ambiguidade desse decreto, sentimento já expresso por amigos de Dom Hélder, inclusive, Marcelo Barros que escreveu uma profética carta dirigida ao Dom da Paz. O texto dessa lei é sucinto e não explicita motivações, nem consequências. No entanto, nenhum ato dessa natureza é neutro ou sem repercussões.
Em seu tempo, o profeta Jeremias adverte os governantes do seu povo: “Sem responsabilidade, querem curar as feridas do meu povo dizendo apenas Paz, Paz, quando paz verdadeira não existe. Deveriam envergonhar-se, pois o que fizeram foi horrível, mas não se acanham, mesmo eles não sabem o que é ter vergonha” (Jer 8, 11- 12).
É nossa responsabilidade de cidadãos e de cristãos dar peso às palavras e exigir dos poderes públicos coerência em seus posicionamentos. Se a Política que deveria ser um exercício nobre do serviço ao bem comum está tão desacreditada é porque os políticos não primam pela coerência entre o seu falar e o seu agir.
O que significa essa medida vir de um governo que justamente esvaziou a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e comprometeu todo o trabalho que vinha sendo feito na luta contra todo tipo de discriminações? Será que nomear Dom Helder patrono brasileiro dos Direitos Humanos fará o governo voltar atrás da decisão de reduzir substancialmente os gastos públicos em saúde e educação, deixando os milhões de pobres abandonados à própria sorte? Como pensar em Direitos Humanos e relaxar as regras do controle ao trabalho escravo, assim como sujeitar os trabalhadores a regras que lhes são contrárias e que retiram direitos adquiridos na Constituição de 1988? E o que dizer da reforma da Previdência Social pela qual esse mesmo governo pressiona de formas ilícitas para vê-la aprovada?
Como arcebispo de Olinda e Recife, ministério que foi ocupado por Dom Hélder Câmara, sinto-me, em consciência, obrigado a declarar publicamente que esse decreto presidencial, para ser sincero e coerente, precisa ser acompanhado por outro modo de governar o país e de cuidar do que é público, principalmente do bem maior que é o povo, sobretudo os mais fragilizados.
Em nome de Deus, fonte de Amor e de Vida, conclamo os cristãos e todo o povo brasileiro a prosseguirmos a luta pacífica pela justiça e pela paz. Assim, como fez Dom Hélder Câmara, trabalharemos pelos Direitos Humanos a partir da defesa dos direitos dos pobres, dos trabalhadores, das minorias excluídas e de todo ser vivo.
O Espírito de Jesus que nasceu como pobre nos acompanhe e nos fortaleça nesse caminho,
Dom Antônio Fernando Saburido
Arcebispo de Olinda e Recife
Assessoria de Comunicação/PSB Nacional