Por 9 votos a 1, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (13) que o compartilhamento de informações por órgãos do governo à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) exige motivação específica e deve levar em conta o interesse público.
A decisão foi tomada em ação protocolada pelo PSB e pela Rede Sustentabilidade. Na petição, os partidos questionaram um decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro que ampliou os poderes da Abin para ter acesso às informações, inclusive as protegidas por sigilo.
Para os partidos, haveria o risco de o presidente “criar seu aparato estatal de investigação e repressão” por meio da solicitação de informações pela Agência.
O julgamento foi marcado por declarações dos ministros contra a possibilidade de “arapongagem” e “dossiês” produzidos pelo governo, embora o tema não estivesse em votação diretamente.
Está marcado para a próxima semana o julgamento da ação que contesta a produção pelo Ministério da Justiça de um relatório sigiloso contra servidores identificados como membros do movimento antifascista.
O advogado do PSB, Rafael Carneiro, alertou para as reiteradas tentativas da Presidência da República de obter maior acesso a dados sigilosos da população, destacando o episódio do dossiê contra servidores antifascistas. “Inteligência é central para o processo de erosão democrática que vem ocorrendo ao redor do mundo”, afirmou.
“Conseguimos impedir que Bolsonaro use a Abin como sua agência paralela de informações”, comemorou nas redes sociais o líder do PSB na Câmara, deputado federal Alessandro Molon (RJ).
“Graças à ação do PSB com a Rede, o governo terá que explicar os pedidos de acesso a relatórios de inteligência e não poderá pedir informações para beneficiar sua família ou seus amigos, apenas para interesse do país e instituições”, destacou Molon.
No julgamento, o STF reafirmou que, nos casos em que a lei exige autorização judicial para acesso, o governo terá que pedir mandado judicial, e determinou ainda que o Executivo terá de criar e manter sistemas eletrônicos que registem todos os acessos a documentos de inteligência.
“Arapongagem, para usar uma expressão vulgar, mas que agora está em dicionário, essa atividade não é direito, é crime. Praticado pelo estado, é ilícito gravíssimo. Toda e qualquer decisão que requisitar os dados deve ser devidamente motivada para eventual controle que se faça necessário da legalidade e da legitimidade da validade do ato pelo Poder Judiciário”, disse a ministra relatora da ação, Cármen Lúcia.
Acompanharam Carme Lúcia, os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli. O ministro Marco Aurélio Mello foi o único a divergir e defendeu a rejeição da ação. O ministro Celso de Mello não participou da sessão.
O ministro Edson Fachin fez discurso duro contra a produção de dossiês. “Tem-se um cenário em que a ausência de protocolos claros de proteção e tratamento de dados, somada à possibilidade, narrada na inicial e amplamente divulgada na imprensa, de construção de dossiês investigativos contra servidores públicos e cidadãos pertencentes à oposição política, deve gerar preocupações quanto à limitação constitucional do serviço de inteligência”, alertou.
O ministro Luís Roberto Barroso lembrou que a Abin já foi investigada internamente porque agentes teriam abusado de suas atribuições. “O perigo é muito grande, a tentação é muito grande”, observou.
A decisão do STF não altera o texto da lei e do decreto que tratam do tema, mas o tribunal estabeleceu que as regras da Constituição exigem que o compartilhamento de informações entre órgãos de inteligência seja feito com base nessas regras.
Com informações do UOL e de O Globo