Na última semana, a Comissão de Educação do Senado realizou a 6ª audiência pública para debater o Plano Nacional de Educação. O tema foi a Meta 4, que trata da inclusão escolar de alunos com deficiência. O projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados com a garantia da manutenção dos Centros de Ensino Especial e das Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apaes) para atender esses alunos. Assim, os pais terão o direito de escolher entre essas instituições e as escolas regulares. Entretanto, no Senado, o texto sofreu emendas.
A professora Rosângela Machado falou de sua experiência como Gerente de Educação Inclusiva da Secretaria Municipal de Florianópolis e defendeu o ensino oferecido pelas escolas regulares. "A base da educação inclusiva requer a reorganização das práticas de ensino regular e especial”, detalhou. "A rede regular de ensino se qualificou e abriu as portas para todos os alunos, com ou sem deficiência, é um caminho sem volta”, defendeu. A Procuradora Regional da República da 3ª Região Eugênia Augusta Gonzaga também defendeu a educação inclusiva. Para ela, o texto aprovado na Câmara dos Deputados é inconstitucional.
Já o vice-presidente da Federação Nacional das Apaes, José Turozi, defendeu o trabalho das Apaes e a liberdade de escolha das famílias das pessoas com deficiência. Ele também lamentou a falta de estrutura das escolas convencionais para receber os alunos especiais e o risco de sofrerem bullying. "A educação inclusiva é uma meta, um processo gradual, mas a inclusão proposta pelo Ministério da Educação provocará exclusão”, alertou. "A Federação Nacional das Apaes do Brasil defende a Meta 4, da forma como o texto veio da Câmara dos Deputados, acreditamos que uma escola não exclui a outra, queremos a inclusão com responsabilidade e não de forma radical”, detalhou Turozi. Existem hoje pouco mais de 2,1 mil Apaes em todo o Brasil, que atendem a cerca de 240 mil alunos.
Vice-governador e secretário de Educação do Paraná, Flávio Arns também defendeu o texto aprovado pela Câmara dos Deputados, que garante o funcionamento das Apaes e dos Centros de Ensino Especial. "Sabemos que todo esforço está sendo feito para que toda pessoa com deficiência seja bem atendida nas escolas convencionais, e queremos que isso aconteça, mas dizer que todos têm de ir para a escola comum, independente de sua necessidade, é equivocado”, detalhou.
"Os pais querem que seus filhos sejam bem atendidos, então, a pergunta que devemos fazer é: do que a criança e o adolescente precisam e onde ele pode ser bem atendidos?”, defendeu. Para ele, o radicalismo é uma falta de respeito com as pessoas com necessidades especiais e suas famílias. "Temos de ter espaço para as duas alternativas e para outras, precisamos parar com este conflito, que não favorece ninguém”, concluiu, ao defender que alternativas sejam pensadas para garantir a cidadania das pessoas com deficiência.
Arns lembrou ainda que o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) aprovou um documento defendendo o texto aprovado pela Câmara dos Deputados. "Qualquer mudança é um retrocesso para a cidadania dos alunos com deficiência”, defendeu Arns. De acordo com o documento, o Consed considera o esforço de atendimento educacional aos portadores de necessidades especiais deve continuar sendo compartilhado pelas escolas e pelas instituições de serviços de atendimento especializado, conforme se mostrar mais eficiente em cada realidade.
A diretora de Políticas Educacionais da Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (Feneis), Patrícia Rezende, lamentou o fato de o sistema atual não estar adequado para receber os surdos. Ela defendeu as escolas bilíngues para surdos, para que as crianças estejam melhor preparadas educacionalmente. "Precisamos trabalhar pela inclusão dos surdos em escolas públicas regulares bilíngues, a língua de sinais não pode ser inferiorizada”, afirmou.
A vice-diretora do Centro Educacional 01 de Brasília, Ana Cristina Correia e Silva, disse que as escolas especiais vivem sob ameaça de extinção há pelo menos dez anos. "As escolas especiais são inclusivas e oferecem atendimento educacional e não clínico, não somos contra a inclusão, somos a favor do indivíduo, as escolas especiais não existem para separar grupos, existem para garantir o direito à educação”, resumiu Ana Cristina. "Quando pensarmos em inclusão, precisamos pensar numa grande revolução do sistema educacional brasileiro”, afirmou. Para ela, as políticas públicas devem ser pensadas a partir das necessidades das pessoas, a parir da sociedade, e não do Estado. Para a diretora, a família tem o direito de escolher a escola de seu filho. "Defendemos as escolas especiais como ambiente educacional inclusivo para qualquer pessoa, independente da idade, como forma de inclusão não apenas acadêmica, mas social”, finalizou.
Por fim, a secretária de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação (MEC), Macaé Maria Evaristo dos Santos, apontou contradições do texto do PNE, que, segundo ela, abre frestas para que o investimento público em educação seja não apenas para as escolas públicas, mas também para particulares. Ela defendeu que o sistema educacional inclusivo. "Temos de debater o melhor caminho para universalizar a educação”, afirmou.
O senador Rodrigo Rollemberg (PSB/DF) participou da audiência pública. "Cumprimento a defesa conceitual das escolas inclusivas, nosso país tem avançado muito, mas não podemos tratar essa questão só do ponto de vista conceitual”, alertou. "Temos um plano para dez anos e quem conhece a realidade das nossas escolas sabe que, embora possamos ter a melhor das intenções, poderemos ter uma grande exclusão social, se defendermos o ensino exclusivo”, acrescentou.
O senador também falou das visitas que fez ao Centro de Ensino Especial 01, na Asa Sul, da diversidade das deficiências e dos cuidados individuais que os alunos recebem em uma escola especial. "Grande parte de nossas escolas não estão preparadas para atender a todos os tipos de deficiência e não estarão nos próximos dez anos, é uma questão de bom senso”, alertou Rollemberg. "Temos de investir nas escolas inclusivas, na acessibilidade, na qualificação dos professores, mas não podemos retirar a liberdade de escolha da família, temos de construir um processo de transição”, acrescentou.
Para Rollemberg, todos defendem a escola inclusiva. "Ao mesmo tempo, as pessoas querem poder escolher a que atende melhor as necessidades de cada aluno, de acordo com sua realidade, e o Estado tem de dar esse direito de escolha, que está na lei”, finalizou o parlamentar.
O PNE foi aprovado na Câmara dos Deputados e remetido ao Senado. Na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), sofreu emendas e o texto passou a garantir o atendimento dos alunos com necessidades especiais apenas nas escolas tradicionais. Na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), o senador Rollemberg apresentou uma emenda à Meta 4 do PNE, que foi acatada pelo relator do projeto, para garantir a continuidade do funcionamento das Apaes e das Escolas Especiais. Outros seis senadores apresentaram emendas com conteúdo semelhante. Agora o PNE está sendo discutido na Comissão de Educação, que realizará a última audiência pública sobre o tema nesta quinta-feira (07). Após aprovado, o texto segue para o Plenário do Senado.