A comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados realizou, nesta quinta (26), audiência pública para debater o novo Marco Regulatório da Mineração – MRM. Há previsão de que o relatório seja votado pela Comissão Especial em 15 de outubro e na semana seguinte vá à votação em Plenário. Se aprovado, vai ao Senado.
Os deputados e representantes da sociedade civil presentes à audiência consideram que o debate está sendo atropelado, por que a matéria é muito complexa e ainda não envolveu suficientemente a sociedade civil.
SUSTENTABILIDADE — A deputada federal Janete Capiberibe (PSB/AP) questionou a capacidade do novo MRM de garantir a sustentabilidade da exploração mineral sem riscos ambientais e com a adequada distribuição da riqueza para que sejam reduzidas as desigualdades sociais, garantido o acesso às gerações futuras e o desenvolvimento após serem encerradas as atividades de mineração.
Janete citou como exemplo a exploração de manganês pela ICOMI, durante 50 anos, no Amapá. Segundo ela, a riqueza extraída não melhorou a vida da população local porque não foi distribuída entre os trabalhadores. “Na venda da vila, uns compravam o que tinha de mais caro. Outros, como era o caso da minha família, meu pai era cozinheiro, mal compravam o pão, o feijão, o arroz e os miúdos. Não quero que aconteça com os outros o que aconteceu comigo”, protestou.
Para ela, a atividade de extração mineral deve ser debatida dentro de um projeto estratégico de desenvolvimento do país, para evitar que a economia se torne cada vez mais primária com a crescente “exportação de natureza”, sem agregar valor e sem se traduzir na melhoria de vida da população.
Janete preocupa-se, ainda, com a possibilidade de haver mineração em unidades de conservação, terras indígenas e quilombolas. “No Amapá, o Ministério Público Federal descobriu 500 requerimentos para exploração mineral em Terras Indígenas. Mandou suspender todos. Estou pedindo informações ao Ministério de Minas e Energia”, anunciou. Janete defende, ainda, que as comunidades afetadas tenham direito ao veto das atividades econômicas que não lhes interessa.
GARANTIAS — O consultor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – IBASE, Carlos Bittencourt, afirmou que foi retirada a urgência na votação do projeto, “mas não a pressa”. Ele alertou para a primarização da economia do país, tendência fortalecida, segundo ele, pelo novo MRM.
Marcel Stenner, Assessor da Secretaria de Geologia, Mineração e Transformação Mineral do Ministério de Minas e Energia, reconheceu que o MRM é complexo e por isso foi apresentada uma lei geral, que chamou de “lei quadro”, aberta para regulamentações posteriores ou decisões discricionárias. As mudanças na política de mineração conforme for o governante também são apontadas como risco pelos representantes da sociedade civil e parlamentares.
Raul Do Valle, Advogado do Instituto Socioambiental – ISA, considera indispensável exigir seguro ambiental das empresas mineradoras e a caução para o encerramento das atividades de mineração. Sugeriu que o novo MRM estabeleça o zoneamento mineral, para determinar áreas livres da atividade mineraria. Sem isso, segundo ele, há o risco de requerimentos para mineração atingirem a totalidade de terras indígenas, quilombolas e unidades de conservação. E citou como exemplo o Vale do Ribeira, em São Paulo, onde isso já ocorre. Outro alerta é a isenção de tributos sobre a atividade de mineração, que paga apenas a Compensação Financeira sobre a Exploração de Recursos Minerais – CFEM.
Jéssica Bogossian, do Movimento Consciência Mineral, questionou a forma de acesso às reservas minerais, que pode concentrá-las em grandes empresas. Segundo ela, há casos de pequenas empresas de estudos e prospecção que já fecharam depois que cessaram as autorizações. O novo código prevê que as autorizações já concedidas e em lavra sejam mantidas, mas retomará as que não iniciaram as atividades e fará leilão para novas áreas.
A audiência aconteceu a pedido dos deputados Janete Capiberibe (PSB/AP), Zé Geraldo (PT/PA), Sarney Filho (PV/MA) e Ivan Valente (PSOL/SP). Participaram, como expositores, Jonatas Souza da Trindade, Coordenador de Mineração e Obras Civis do Ibama – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, representante do Ministério do Meio Ambiente; Marcel Stenner, Assessor da Secretaria de Geologia, Mineração e Transformação Mineral do Ministério de Minas e Energia; Carlos Bittencourt, Consultor do IBASE – Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas; Jéssica Bogossian, Representante do Movimento Consciência Mineral e Raul do Valle, Advogado do ISA – Instituto Socioambiental.