A deputada federal Lídice da Mata (PSB-BA) apresentou, nesta semana, um projeto de lei que prevê de dois a quatro anos de prisão para quem pesquisar e divulgar dados privados de crianças e vítimas ou testemunhas de violência.
Segundo a socialista, o PL 4306/2020 tem como objetivo resguardar o direito da criança ou adolescente de pleitear a exclusão de informações pessoais de sites de pesquisa ou de notícias que possam causar-lhes constrangimentos ou danos psicológicos.
“O fato que acompanhamos, na última semana, expôs uma criança e sua família a uma nova situação de violência extrema, revitimizando a menor, especialmente porque o caso ganhou grande repercussão nacional, notadamente na internet”, explicou Lídice, numa referência ao vazamento de dados de uma criança de 10 anos, vítima de violência sexual no Espírito Santo, feito pela militante extremista bolsonarista Sara Geromini.
“Este tipo de situação a que ela foi exposta poderá lhe causar danos psicológicos irreparáveis, tendo em vista que as informações e notícias sobre o caso estarão eternamente à disposição de qualquer pessoa que deseje pesquisar sobre o assunto na internet”, complementou.
Como medida protetiva depois que seu nome e endereço foram vazados, a criança entrou na última quinta-feira (20) no Programa de Apoio e Proteção às Testemunhas no ES, destinado a testemunhas e vítimas de crimes coagidas ou expostas a grave ameaça.
Para Lídice, que também é relatora da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News no Congresso, é necessária uma previsão legal para que casos como este não voltem a ocorrer.
“Temos acompanhado estes delitos através da CPMI das Fake News. Então, o PL que apresentamos tem também o objetivo de coibir mais fortemente esta prática, agravando as penalidades quando a vítima é uma criança ou um adolescente”, afirma.
O projeto da deputada acrescenta a punição para a prática do “doxxing” nas redes sociais, alterando a Lei 13.431/2017, conhecida como Lei do Bullying. A expressão significa a prática de se obter dados privados de uma pessoa e torná-los públicos na web, por diversos meios.
Lídice da Mata explica também que o projeto foi pensado numa tese bastante discutida nos Tribunais Superiores brasileiros, o Direito ao Esquecimento, que uma pessoa possui de não permitir que um fato, ainda que verídico, ocorrido em determinado momento de sua vida, seja exposto ao público em geral, causando-lhe sofrimento ou transtornos.
Desmonte do combate à violência infantil no governo Bolsonaro
O governo de Jair Bolsonaro excluiu do último relatório de direitos humanos, o Disque Direitos Humanos, as informações sobre o encaminhamento e as respostas dadas a todas as denúncias de violações recebidas, entre elas, as de violência infantil, feitas aos órgãos de apuração e proteção.
Divulgado em maio deste ano em referência a 2019 pelo Ministério da Mulher, da Família e de Direitos Humanos, o relatório do Disque 100 informa que foram formalizadas 86.837 denúncias de violência contra crianças e adolescentes, que representam 55% do total recebido e uma alta de 13,9% em relação ao ano anterior.
O relatório é elaborado pela Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos com base em denúncias feitas ao Disque 100, canal criado para atender os relatos de violação de direitos humanos no país.
O maior volume de casos diz respeito a negligência (38%), enquanto a violência sexual representa 11% das denúncias. É computada ainda a incidência de violência psicológica (23%), violência física (21%), exploração do trabalho (3%), entre outras.
O relatório aponta ainda que 52% das violações ocorrem na casa da criança ou do adolescente —cenário que especialistas temem se agravar com a pandemia de coronavírus e a quarentena. De modo geral, 69% dos atos ocorrem com frequência diária.
A questão é que não se sabe que encaminhamento foi dado às denúncias recebidas —nem mesmo se alguma providência foi tomada.
O ministério alega uma “decisão editorial” sobre a exclusão dos dados, mas que todas as denúncias recebidas são encaminhadas.
Para o advogado Ariel de Castro, membro do Conselho Estadual de Direitos Humanos (Condepe), a falta de retornos e providências gera descrédito e desqualifica o sistema do Disque 100.
“Os denunciantes perdem a confiança no sistema, desestimulando denúncias e deixando as crianças e adolescentes mais em risco ainda. Para quê denunciar se não serve pra nada? Providências não são tomadas, ou se são, não se sabe. Devemos presumir que as vítimas continuaram em risco”, disse.
Com informações da Ascom da dep. Lídice da Mata e da Folha de S. Paulo