A CONJUNTURA NACIONAL, A CRISE SANITÁRIA, A AUTORREFORMA E AS PERSPECTIVAS DO PSB
1. CONJUNTURA NACIONAL
Desde a última avaliação de conjuntura realizada no âmbito do Diretório Nacional (DN), ocorrida na reunião virtual do colegiado em 11/12/2020, o cenário nacional alterou-se de forma significativa, mas dentro das linhas previstas no documento apresentado na oportunidade.
Deste modo, pode-se destacar inicialmente o franco agravamento da crise sanitária provocada pelo COVID. É flagrante a esta altura a gravidade da pandemia, mas muito mais evidente é o fato de que ela, no Brasil, ganhou contornos próprios pela ausência de políticas públicas minimante adequadas a seu enfrentamento.
No período de menos de um ano tivemos quatro ministros da Saúde, campanhas sistemáticas de desinformação e postura negacionista praticada pelo governo federal e seu primeiro mandatário, desorganização do processo de aquisição de imunizantes – observada total inação na compra de vacinas, quando se iniciava o processo de negociação das mesmas em escala global, com o governo federal se dando ao luxo de dispensar oferta da Pfizer, da ordem de 70 milhões de doses!
Não bastasse a “guerra particular” contra a Pfizer, o presidente Jair Bolsonaro desautorizou, ainda, o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, e suspendeu (21/10/2020) a compra do produto desenvolvido pelo laboratório chinês Sinovac com o Instituto Butantan, que envolvia algo da ordem de 46 milhões de doses[1] – uma ironia do destino, uma vez que o presidente se veria obrigado, mais à frente, a contar exclusivamente com este imunizante para iniciar a campanha nacional de vacinação.
O atual governo militarizou e partidarizou o Ministério da Saúde, excluindo técnicos e quadros de carreira que ao longo dos anos contribuíram com as diversas políticas de saúde. Em razão disso, desorganizou a Política Nacional de Imunizações, que era exemplo mundial. O uso sistemático desse arsenal obscurantista nos levou ao marco de mais de 4 mil mortes por dia, que foi atingido pela combinação de baixos índices de isolamento social e vacinação a passos de tartaruga.
Não satisfeito em manter uma não política de saúde face à pandemia, o presidente da República tem realizado todos os esforços a seu alcance para atrapalhar aqueles que têm se desdobrado para modificar o cenário atual, particularmente governadores e prefeitos, que se deparam de modo mais imediato com o sofrimento da população e as agruras a que vem sendo submetida.
Diante dessa quadra trágica de nossa história, o PSB se solidariza com as mais de 350.000 famílias enlutadas pelas mortes de COVID-19 no Brasil. Da mesma forma, exige providências imediatas do Governo Federal para que as previsões de que em 01/07/2021 que indicam que poderemos ter 562.000 mortos não se confirmem, pois esse genocídio não pode continuar.
Louve-se, nesse sentido, a clareza política e firmeza de propósitos que têm tido os governadores de nosso partido no combate à pandemia – Paulo Câmara (PE) e Renato Casagrande (ES) –, que se deparam com falta de recursos, pessoal técnico em saúde próximo do esgotamento, mau humor da população com o prolongamento de medidas restritivas e, finalmente, uma saraivada de fake news disparadas pelo primeiro mandatário do país e, mesmo assim, seguem firmes com as medidas necessárias a salvar vidas.
Dentre as fake news presidenciais, algo que se tornou comum é a desinformação reiterada sobre a realidade dos repasses feitos pelo governo federal aos estados, sempre com o propósito de insinuar que os governadores estão sendo ineptos no uso dos recursos, quando não se busca “denunciar” a malversação de recursos públicos, como se nas instâncias subnacionais houvesse uma bandalheira com dinheiros destinados ao enfrentamento da pandemia. É evidente, no entanto, que essas acusações não passam de cortina de fumaça, para desviar as atenções da responsabilidade objetiva, material, do governo federal pelos rumos trágicos tomados pela crise sanitária.
Cabe ressaltar neste tópico, também, o excelente trabalho realizado pelos prefeitos João Campos (Recife) e JHC (Maceió), além de outros tantos companheiros prefeitos (as) do partido, que têm estado ombro a ombro com seus concidadãos nesse momento de angústia e sofrimento. Igual distinção deve ser feita ao ex-prefeito de Campinas, Jonas Donizette, que na condição de presidente da Frente Nacional de Prefeitos (FNP) tem se dedicado a preparar os municípios brasileiros para fazerem frente a pandemia, inclusive com a instituição de consórcio com a finalidade de adquirir doses de imunizantes contra o Covid.
No fronte econômico as coisas também vão muito mal e consolidam o prognóstico feito no documento apresentado ao DN em sua última reunião: o PIB de 2020 caiu 4,1% face a 2019, o desemprego supera a marca de 14 milhões de trabalhadores, os índice inflacionários sobem – o que justificou inclusive o aumento da taxa básica de juros pelo Comitê de Política Monetária (Copom), alterando a prática de redução paulatina que durou 6 anos. Insegurança alimentar e pobreza se alastram pelo país, que assiste também a um aumento expressivo da população em situação de rua, especialmente nas grandes cidades e capitais. Para se ter ideia de quão sinistro é o quadro, basta indicar que segundo projeção da FGV Social, quase 27 milhões de pessoas encontram-se em pobreza extrema no Brasil – fenômeno que afeta com particular intensidade mulheres e pessoas pretas ou pardas.
Note-se que juros mais altos produzirão efeitos contracionistas, penalizando ainda mais segmentos em condição de vulnerabilidade, que já são pesadamente onerados por taxas de inflação mais altas para seu grupo de renda (o preço dos alimentos subiu significativamente mais do que os preços em geral), pela perda de renda e emprego, pelos cortes promovidos pelo governo federal nas políticas sociais, além de serem muito mais afetados pelas consequências sanitárias, econômicas e sociais da pandemia.
A carestia de vida do povo brasileiro, caracterizada por inflação em alta, aumento de preços de alimentos, bem como, o arrocho salarial e desemprego é uma característica de governos autoritários que não tem apreço pela vida, valor essencial a todos os movimentos que o PSB empreende, nos parlamentos, nos movimentos sociais e nas administrações que lidera .
Nunca é demais lembrar que a fragilidade econômica do Brasil é anterior à pandemia, iniciando-se na prática com o segundo mandato da presidente Dilma Rousseff. Os governos subsequentes, no entanto, se esmeraram em agravar ao máximo o cenário, adotando sem reservas a cartilha ultraliberal. Assim, as reformas trabalhista e fiscal, a PEC do teto de gastos etc., que prometeram criar milhões de empregos, melhorar a renda, estimular o ambiente de negócios nada entregaram de efetivo, mas têm sido muito funcionais para promover aumento da desigualdade de renda, pobreza, ampliação descontrolada da informalidade nas relações de trabalho, desnacionalização da economia brasileira, até chegarmos ao ponto em que nos encontramos agora, ou seja, de um país na lona e sem qualquer projeto de futuro minimamente promissor. E tanto mais pioramos, tanto maior o clamor dos artífices da destruição do país por mais “reformas”, mais cortes nas políticas sociais, mais privilégios aos capitais nacionais e internacionais.
O cenário político mantém uma significativa complexidade. Se por um lado é evidente que a aprovação do presidente e de seu governo vêm caindo pesquisa a pesquisa, devido à tragédia produzida pela administração federal nos aspectos sanitários e socioeconômicos, também é claro que existe uma fidelização de parte da população ao bolsonarismo. Esta “fidelização”, no entanto, precisa ser observada em sua evolução, especialmente porque pode ser afetada pelo andamento das crises sanitária e econômica.
Há que se observar, ainda, como elemento de realidade, que o presidente da República prepara metodicamente uma solução autoritária para 2022, na justa medida que procura cooptar efetivos das Polícias Militares nos estados e estimula, por meio de sua tropa de choque, a desobediência daqueles aos governadores. No mesmo pacote de iniciativas de viés autoritário devem ser citados:
Com relação às Forças Armadas, há que se abordar de maneira mais atenta a crise que se abriu com a exoneração do Ministro da Defesa e que levou à demissão dos comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica. Para além do imbróglio político que se criou, é preciso considerar por um lado os sinais emitidos pelos militares, de que não participarão das aventuras autoritárias do bolsonarismo e saudar a postura de seus comandantes – e lideranças da reserva – que, prontamente, reagiram à tentativa de desviar as Forças Armadas de suas funções em um regime democrático.
Não se deve deixar de lado, no entanto, a realidade de que na política tudo é dinâmico, o que recomenda ficarmos atentos à atuação do novo ministro da Defesa, general da reserva que já integrava o governo, e que deve pressionar os comandantes das Forças Armadas a apoiar ou, ao menos, “fazer vistas grossas” aos arroubos autoritários do atual mandatário do país.
2. INICIATIVAS PARA O ENFRENAMENTO DA CRISE POLÍTICA, SANITÁRIA, ECONÔMICA E SOCIAL
É preciso reconhecer uma vez mais que a mãe das crises no Brasil é a crise política. Afinal de contas, foi um sistema político carcomido, em estado de necrose, que gestou Bolsonaro, suas milícias digitais e reais, alianças da extrema-direita com a centro-direita, além de um apego claudicante do governo, mas efetivo para fins práticos, ao ultraliberalismo – encabeçado neste caso pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.
Reverter este cenário exige do PSB, das oposições e dos democratas em geral atuação metódica e determinada, para propor e implantar medidas, como as que se indicam a seguir:
Temos, ainda, que usar e estimular a criatividade, fazer mais com menos, sensibilizar a população para os imensos desafios do momento. Estamos como partido muito bem aparelhados para isso, uma vez que o processo de Autorreforma já acumulou um imenso acervo de ideias, conceitos, informações, políticas públicas e propostas, que nos permitirão realizar muito e de maneira mais efetiva, eficiente, equitativa e democrática. É chegada a hora, portanto, de tirar a criatividade de nossos livros e compêndios e de transformá-la em motor de políticas públicas, dando à Autorreforma do PSB a materialidade e visibilidade a que ela está destinada.
3. DESAFIOS ELEITORAIS DO PSB
O principal desafio político do partido em 2021 é o de montar chapas próprias, para disputar mandatos federais – especialmente Câmara dos Deputados – em todos os estados. Faz parte de tal esforço potencializar candidaturas a governador (a) e Senado Federal, que demonstrem efetiva viabilidade eleitoral. Evidentemente essa linha de atuação responde à proibição das coligações em eleições proporcionais e ao fato de que os recursos dos fundos partidário e eleitoral são distribuídos com base no número de votos para deputados federais obtidos pelos distintos partidos e, em menor grau, também para candidaturas ao Senado Federal.
A criatividade que estamos a defender na nossa autorreforma como uma das principais marcas do nosso partido, precisa ser aplicada em todos os campos da atividade política. Inclusive no desafio eleitoral de 2022. Se quisermos inovar na política e renovar o nosso partido será necessário transformar a tarefa de compor nossas chapas de candidatos – especialmente para o âmbito federal – num processo criativo e inovador. Essa inovação deve se traduzir, na prática, em recrutamos para o nosso partido quadros da sociedade que se destaquem em todas as áreas profissionais, científicas, empresariais, dos movimentos e redes sociais e que se identifiquem com os ideais socialistas da luta contra as desigualdades. Acreditamos que o livro 4 da autorreforma, com nossas propostas de teses, devam-se constituir numa importante ferramenta para a atuação de novos quadros e militantes do nosso partido. E as concordâncias com as principais teses são também um filtro para que não se repetirem eleições de parlamentares que nada tem a ver com nosso ideário, principalmente com as nossas ideias de combate às desigualdades.
Soma-se a tal aspecto a necessidade imperiosa de que o PSB passe bem pela cláusula de desempenho previsto na legislação eleitoral atual, para que o partido possa ter aspirações tão altas quanto as de apresentar ao Brasil um projeto nacional de desenvolvimento e postular – por formular diretrizes e políticas efetivas contra as crises política, econômica, social e ambiental – o comando do governo federal.
A decisão sobre a sucessão do atual presidente, por sua vez, poderá ficar, salvo decisão contrária, para o início do próximo ano, oportunidade em que os cenários para a avaliação do tema estarão efetivamente amadurecidos, inclusive quanto à conjuntura que deverá orientar os rumos das disputas políticas no pleito presidencial. Evidentemente não se pode interditar o debate sobre esta temática, algo até mesmo natural e saudável para que se refinem as percepções e estratégias que deverão nortear a decisão final do partido.
4. CONTINUIDADE DA AUTORREFORMA DO PSB
A principal contradição do Brasil da atualidade é a que opõe a democracia ao autoritarismo, o que obriga considerar que o futuro do país depende de sua adequada resolução. O PSB desde há muito tempo diagnostica a crise política como o motor que tem nos levado à perda de dinamismo econômico, empobrecimento da população, reaparecimento de fenômenos erradicados, como a fome.
Ou seja, a crise política alimenta o terreno em que as demais crises se desenvolvem, produzindo inclusive ameaças concretas à vigência do Estado Democrático de Direito – de um modo geral estimuladas, gestadas e produzidas pela extrema-direita e seu líder supremo.
Superar este cenário requer uma ampla reforma do sistema político-partidário e eleitoral, iniciativas pelas quais o PSB tem militado e que antecipou em sua própria práxis política, ao se decidir por sua Autorreforma – uma vez que o sistema político se mantém refratário à mudança de suas práticas, cabe a cada partido transformar tudo quanto esteja a seu próprio alcance.
Observe-se, uma vez mais, que o processo de Autorreforma tem dimensões internas e externas, ou seja, orienta uma reorganização significativa interna ao PSB (como a ampliação de mecanismos de democracia interna), mas também se dirige à sociedade civil, no sentido de engajá-la na luta pela defesa e ampliação dos direitos democráticos, políticos, econômicos, sociais e ambientais.
Mais ainda, por meio da Autorreforma o PSB tem buscado formular um projeto nacional de desenvolvimento, o estabelecimento de uma agenda política que possa retirar o país das crises a que tem estado submetido desde meados de 2013.
Trata-se, portanto, de um processo de construção, é obra coletiva, que envolve todos os filiados ao partido, mas também seus simpatizantes, personalidades da sociedade civil, instituições de distintas naturezas, como universidades, centrais sindicais e sindicatos, igrejas, organizações do terceiro setor etc.
O processo de Autorreforma tem alguns marcos, como todos sabem, e seu término deve coincidir com o debate de suas teses e propostas no XV Congresso Nacional do PSB. Observe-se a sintonia de agendas: assim que concluirmos a Autorreforma se descortinará a disputa presidencial.
Qualquer que seja, nesse momento, a definição que venhamos a adotar quanto à sucessão presidencial, o fato objetivo é que teremos posições qualificadas a defender, teses a apresentar aos brasileiros, diretrizes, indicativos de projetos e programas.
Seremos, portanto, um ator qualificado disputando as eleições para implementar um projeto de país economicamente dinâmico, justo, equitativo e guiado por políticas públicas adequadamente desenhadas. Levantaremos, sobretudo, uma plataforma política que assegure a preservação do Estado Democrático de Direito e, com ele, a coesão social sem a qual nenhum povo pode concentrar esforços adequados a seu pleno desenvolvimento.
O Partido Socialista Brasileiro, por meio de sua Autorreforma, deseja transformar-se em sujeito político de primeira grandeza, motivado pelo desejo inequívoco de servir ao povo brasileiro que, neste momento, encontra-se entregue a sua própria sorte, por um governo que tem por meta principal, se não única, estabelecer um regime autoritário no Brasil.
Como dizem sempre os democratas de todos os tempos, NÃO PASSARÃO!
Brasília-DF, 10 de abril de 2021.
CARLOS SIQUEIRA
Presidente Nacional do Partido Socialista Brasileiro – PSB
[1] “A vacina chinesa de João Doria, qualquer vacina antes de ser disponibilizada à população, deve ser comprovada cientificamente pelo Ministério da Saúde e certificada pela Anvisa. O povo brasileiro não será cobaia de ninguém. Minha decisão é a de não adquirir a referida vacina”. Jair Bolsonaro, 21/10/2020.
[2] Programas em que os Estados oferecem trabalho digno a todos que o requeiram, direcionando os pretendentes para necessidades sociais e ambientais do país ou unidade federada. Essa solução é apoiada conceitualmente pela Teoria Monetária Moderna.
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