O PSB e outros partidos da oposição pediram nesta quarta-feira (3) que a Procuradoria Geral da República investigue Milton Ribeiro, ministro da Educação, após o governo Bolsonaro ter punido arbitrariamente dois professores da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) com uma advertência oficial após criticarem Jair Bolsonaro em uma live nas redes sociais da instituição.
“O ataque às universidades públicas por parte do governo federal não é algo novo. A escalada autoritária em face da autonomia universitária está na ordem do dia do governo Bolsonaro, sobretudo por aqueles que hoje dirigem o Ministério da Educação”, escreveram o PSB, PDT, PT, PCdoB, PSOL, e Rede à PGR.
Os partidos lembraram ainda na representação que no ano passado o STF decidiu, por unanimidade, serem inconstitucionais quaisquer decisões que vedem a liberdade de expressões nas universidades.
Além de Milton Ribeiro, a oposição solicitou que Eduardo Gomes Salgado, diretor de Desenvolvimento da Rede de Instituições Federais de Ensino Superior (Difes) também seja alvo de investigação. Na representação, os partidos pedem ainda a anulação da advertência dada aos docentes.
O processo contra Pedro Hallal (foto), doutor em epidemiologia e ex-reitor da universidade, e Eraldo Santos Pinheiro, pró-reitor, foi instaurado pela Controladoria-Geral da União (CGU), a partir da representação do deputado federal Bibo Nunes (PSL-RS). Os dois professores assinaram um termo de ajustamento de conduta (TAC), um acordo firmado em casos de infração disciplinar de menor potencial ofensivo que impede a continuidade do processo administrativo.
De acordo com Hallal, ele teve que se comprometer a não repetir as críticas ao presidente pelos próximos dois anos.
No entanto, em entrevista à revista carta Capital, Hallal disse que vai “seguir manifestando as mesmas opiniões que eu manifesto até hoje, em todos os assuntos sobre os quais sou consultado. Especialmente sobre a Covid-19”.
“Esse processo, formalmente, não tem nada a ver com a Covid-19, mas todo mundo sabe que, na prática, ele tem tudo a ver com a Covid-19. Então, vou seguir manifestando livremente as minhas opiniões sobre a tragédia, o fracasso que é a ação do governo federal no combate à pandemia, que tem custado as vidas de tantos brasileiros. Estão morrendo pela incapacidade do governo em aplicar as medidas sanitárias defendidas pela ciência”, afirmou à revista.
Críticas a intervenção
Os dois professores se pronunciaram em 7 de janeiro, em uma live nas redes sociais da instituição que encerrava o mandato de Hallal. Após votação para definir o substituto do então reitor, Bolsonaro nomeou a segunda mais votada da lista tríplice, Isabela Fernandes Andrade, que depois de eleita resolveu dividir o cargo com Paulo Ferreira Júnior, o mais votado.
“Quem tentou dar um golpe na comunidade foi o presidente da República, e eu digo presidente com “p” minúsculo. Nada disso estaria acontecendo se a população não tivesse votado em defensor de torturador, em alguém que diz que mulher não merecia ser estuprada ou no único chefe de Estado do mundo que defende a não vacinação da população”, disse o Hallal na ocasião.
A CGU baseou-se em artigo da lei 8.112 que proíbe funcionário públicos de “promover manifestação de apreço ou desapreço no recinto da repartição”. Para a Controladoria, como as falas foram feitas em canais oficiais da Ufpel no Youtube e o Facebook, a opinião dos profissionais foi dada em um “local de trabalho” e “em meio digital de comunicação online disponibilizado pela universidade”.
Na mesma transmissão, Eraldo também se posicionou: “Grupo liderado por um sujeito machista, racista, homofóbico, genocida, que exalta torturadores e milicianos. Que ao longo do tempo vem minando, destruindo as estruturas já precárias de nossas instituições”.
Hallal afirmou que uma em análise feita por seus advogados foi descartada a possibilidade de haver infrações graves e determinou que o único enquadramento possível seria no artigo sobre o “desapreço”, considerado de menor potencial ofensivo. Por isso, o professor preferiu assinar o TAC e evitar um processo.
“A CGU fez uma análise técnica do processo, corretamente, muito bem feita, identificou que nenhuma das faltas graves mencionadas tinha ocorrido e que a única possível infração, em tese, teria sido o desapreço — relatou o ex-reitor. — Eu conversei com os meus advogados e entendemos que esse era um desfecho adequado para nós, porque era um arquivamento sumário do processo. As acusações graves a própria CGU descartou”, explicou o docente.
Bibo Nunes afirmou ao jornal O Globo que fez representações contra Hallal em diversos órgãos e que pediu o afastamento do professor da vida pública. Ele considera o TAC “muito aquém” do necessário.
‘Prevenir e punir atos político-partidários’
Alinhado com o posicionamento da CGU, o Ministério da Educação encaminhou, em fevereiro, ofício à Rede de Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes) pedindo providência para “prevenir e punir atos político-partidários nas instituições públicas federais de ensino”.
A orientação é baseada em uma recomendação de 2019 do procurador-chefe da República em Goiás, conservador, bolsonarista e atuante em defesa do presidente Jair Bolsonaro, Ailton Benedito de Souza. Ele se descreve como “anticomunista” e dá apoio irrestrito à agenda do Executivo federal, embora atue no MPF com assuntos diretamente relacionados ao governo.
A recomendação do Ministério Público Federal (MPF) diz que bens públicos “não podem ser empregados para promoção de eventos de natureza político-partidária, porque destoante da finalidade pública a que se destina, que é a prestação de serviços públicos específicos, a promoção do bem comum da sociedade”.
De acordo com o texto, a manifestação política contrária ou favorável ao governo representa malferir “o princípio da impessoalidade”. Outro trecho da recomendação diz que “a promoção de eventos, protestos, manifestações etc. de natureza político-partidária, contrários ou favoráveis ao governo, caracteriza imoralidade administrativa”.
O ofício é assinado pelo diretor de Desenvolvimento da Rede de Ifes, Eduardo Gomes Salgado. Ele esclarece que a recomendação visa atender à solicitação da Corregedoria do Ministério da Educação, em “face ao recebimento de denúncias”.
Com informações do Jornal O Globo