Autor: Tadeu Alencar
Procurador da Fazenda Nacional e líder do PSB na Câmara dos Deputados
A sociedade brasileira reage indignada a um Estado que é caro, pesado, patrimonialista, corporativo, burocrático, injusto e ineficaz. É caro porque a carga tributária é elevada e equivale a 34% do Produto Interno Bruto (PIB), mais 6% deste que se gasta mais do que se arrecada, totalizando 40% da riqueza nacional que é despendida para custear o funcionamento da máquina pública. Essa máquina é pesada, com elevado número de ministérios, com mais de 20 mil cargos comissionados, 149 empresas estatais, em descompasso com a agilidade desejável para o cumprimento de sua função institucional com foco no cidadão.
É também patrimonialista o Estado brasileiro, numa conveniente e perniciosa confusão entre o público e o privado. Os arautos do liberalismo selvagem em vigor, embora advoguem a retração máxima da presença estatal, não resistem a favores fiscais empregados à larga, sem contrapartidas que favoreçam o crescimento e a empregabilidade, que poderiam justifica-los. De igual modo, também não resistem aos encantos das anistias recorrentes, que alimentam a crença de que pagar tributos é obrigação dos tolos. Só no ano de 2017, tais subsídios montaram a R$ 270,4 bilhões, sem contar o recente programa de refinanciamento e perdão de dívidas aprovado pelo Congresso Nacional, que é um ultraje ao contribuinte adimplente, pessoa física ou jurídica, uma vez que, para arrecadar R$ 500 milhões, abre-se mão de R$ 543,3 bilhões.
Mais: esse Estado é também corporativo, quando sustenta privilégios em todos os três poderes, que já não têm guarida numa sociedade democrática, de pretensa igualdade de todos perante a lei. Certo que a Operação Lava-Jato — a despeito de alguns excessos — é uma afirmação importante da ética republicana, subordinando os poderosos — empresários, agentes públicos e políticos — ao império das leis; do mesmo modo é a extinção do foro por prerrogativa de função que, de tão adulterado, resultou em privilégios e odiosa impunidade.
Precisamos seguir mudando, varrendo privilégios onde houver, para que as corporações — que, como instituições republicanas, precisam ser fortalecidas — não percam de vista a razão de ser da sua própria existência, que é a de bem servir à coletividade, pois não são, não devem e não podem ser, um fim em si mesmas. Refiro-me ainda ao caráter burocrático da administração pública no Brasil, a concorrer de maneira determinante para o chamado Custo Brasil, com perdas graves a manietar a competitividade da nossa economia. Simplificar é a palavra de ordem, para que a relação Estado x sociedade seja de cidadania e não uma relação autoritária, do súdito com o reino a que se deve obediência.
É também profundamente injusto o Estado brasileiro, pois a carga tributária, sobre ser elevada, é maldistribuída, tributando em demasia a produção e o consumo, com grande peso nos tributos indiretos, o que faz com que os pobres paguem muito mais que os ricos, em frontal ofensa à Constituição, que consagra o princípio da capacidade contributiva e o da isonomia, como seu corolário. Por fim, além de caro, pesado e injusto, não vemos devolvido o esforço dos contribuintes, na forma de políticas públicas que melhorem a condição de vida da população. Segundo dados estatísticos confiáveis, entre os 30 países que mais arrecadam, o Brasil é o último no retorno em serviços públicos de qualidade. Estamos no pior dos mundos. Inevitável, pois invocar os versos de Chico Buarque: “Já conheço os passos dessa estrada, sei que não vai dar em nada”. Ou pior: sabemos todos muito bem onde nos levaram essa estrada de desatinos.
* Artigo originalmente publicado no Correio Braziliense em 16/7/2018