
Foto: Zeca Ribeiro/Agência Câmara
O enfrentamento da violência contra a mulher exige a adoção de políticas públicas amplas, multidisciplinares e integradas, que envolvam a prevenção, a assistência ampla à mulher em situação de violência e a responsabilização dos agressores. Essa é uma das conclusões do relatório final da Comissão Externa da Câmara, liderada pela deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP), que analisou o combate à violência doméstica contra a mulher.
Criada em março de 2019, a comissão acompanhou casos de feminicídios no país e avaliou as estruturas públicas que oferecem apoio às mulheres que sofrem algum tipo de violência. O texto foi aprovado pelo colegiado.
O relatório e o trabalho da comissão não se restringiram apenas à violência doméstica e ao feminicídio, mas também abordaram a violência obstétrica e todas as formas de violência sofridas por crianças.
Segundo a deputada, o primeiro passo para enfrentar esses crimes é reconhecer o tabu que envolve o tema. Muitas vítimas não denunciam nem buscam ajuda por estarem inseridas em contextos que naturalizam a violência, pelo medo de serem revitimizadas, questionadas ou desacreditadas, e pelo receio de que o agressor continue impune.
Para mudar essa realidade, Tabata Amaral defende a implementação de políticas educacionais que abordem o tema desde a escola, a realização de campanhas públicas e o preparo adequado dos servidores públicos das áreas de segurança e saúde, para que acolham as vítimas e atuem conforme protocolos ao receber denúncias ou identificar indícios. “Precisamos de educação, campanhas e uma estrutura pública capaz de acolher e encaminhar essas denúncias”, alerta.
Mais da metade dos estupros registrados no Brasil têm como vítimas meninas com menos de 13 anos de idade. Entre março de 2020 e dezembro de 2021, mais de 100 mil meninas e mulheres sofreram violência sexual.
A escola é um dos principais canais para a denúncia de abuso infantil, pois professores e diretores preparados podem identificar sinais e agir com segurança. “Professores, diretores, quando estão preparados, quando estão empoderados para lidar com isso com segurança, são um canal muito importante para identificar que uma criança está agindo de forma diferente”, afirma Tabata.
A legislação pode ser aperfeiçoada, mas o grande desafio está em romper a barreira cultural que ainda envolve os crimes de abuso sexual infanti. “Nós não estamos chegando a essas pessoas, e não vamos chegar enquanto não mudarmos a cultura em torno desses crimes, enquanto não existir profissionais, enfermeiros, policiais, professores, preparados para identificar e sabendo como devem agir”, argumenta.
Mulheres negras e mulheres trans, por exemplo, estão entre as maiores vítimas de violência. Enquanto os feminicídios contra mulheres brancas apresentaram queda, os casos envolvendo mulheres negras aumentaram, assim como os assassinatos de pessoas trans. Esses dados evidenciam que a luta contra a violência de gênero não pode ser dissociada das lutas contra o racismo e a LGBTfobia, afirma Tabata.
Há uma carência urgente de protocolos padronizados em todo o país: não importa se uma delegacia está na periferia de São Paulo ou em uma comunidade ribeirinha no interior do Amazonas, todos os profissionais, policiais, servidores públicos, agentes de saúde, precisam estar treinados e sensibilizados para agir com o mesmo preparo e olhar atento às vulnerabilidades específicas de cada grupo, propõe a parlamentar.
A deputada afirma que a violência obstétrica, que atinge mulheres durante o parto por meio de abusos físicos, verbais ou psicológicos, ainda carece de uma definição legal clara no Brasil. Atualmente, não existe um entendimento comum sobre o que caracteriza esse tipo de violência, algo fundamental para que médicos, população e o sistema de Justiça compreendam e enfrentem o problema de forma efetiva, aponta.
Além dessas lacunas, há uma grave deficiência na produção e unificação de dados: muitos estados utilizam metodologias diferentes, o que dificulta a análise nacional e a formulação de políticas públicas. Também faltam sistemas integrados que permitam, por exemplo, o acompanhamento de medidas protetivas com base em dados científicos e tecnologias como o rastreamento por GPS.
Bancada feminina
Diante desse cenário, a bancada feminina no Congresso pretende não apenas apresentar novos projetos de lei, mas também enfrentar a falta de orçamento. Nos últimos quatro anos, políticas públicas voltadas para as mulheres sofreram cortes significativos, comprometendo a estrutura necessária para sua aplicação. “Não adianta ter uma lei elogiada internacionalmente se não há delegacias da mulher suficientes, recursos para treinamento ou acolhimento efetivo às vítimas”, alerta Tabata.
A violência psicológica, muitas vezes invisível e de difícil identificação, é um dos desafios mais complexos no enfrentamento à violência contra a mulher. Por isso, segundo Tabata Amaral, a bancada feminina fez questão de abordar o tema no relatório, reforçando que, como já previsto na Lei Maria da Penha, a agressão física costuma ser precedida por outros tipos de violência, especialmente a psicológica.
Nos últimos quatro anos, a bancada conquistou avanços importantes, como a aprovação da Lei Maria da Penha, da Lei Maria Ferrer, da norma que garante a destinação de pelo menos 5% do Fundo Nacional de Segurança Pública para políticas voltadas às mulheres, projeto relatado pela deputada, e, mais recentemente, a tipificação da violência psicológica no Código Penal. “Temos uma lei hoje tipificando a violência psicológica, o que é um grande avanço. O primeiro passo é a gente dizer, isso é um problema, está aqui a definição do problema, agora a gente precisa solucioná-lo”.
Com informações da Rádio Câmara






