A maioria esmagadora dos chilenos votou no plebiscito deste domingo, 25 de outubro, pela realização de uma nova Constituição, que substituirá a carta em vigor desde o governo autoritário do general Augusto Pinochet.
Com participação recorde, mais de dois terços dos chilenos votaram pela nova redação da Constituição; segundo a autoridade eleitoral, de 7,3 milhões de votos contados, foram 78% contra 21,7% que se opunham à mudança. Apesar das restrições impostas pela pandemia do novo Coronavírus, a participação foi recorde e superou a média das últimas eleições.
O presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, saudou em suas redes sociais o “resultado acachapante” do plebiscito e afirmou que “os ventos de mudança sopram na América Latina com o povo nas ruas e a mesma mobilização das manifestações de 2019 pela democracia”. Segundo ele, “o resultado é um gigantesco movimento democrático contra o neoliberalismo e em defesa dos direitos do povo chileno”.
Um ano depois da eclosão de grandes protestos no país, as grandes alamedas voltaram a se abrir aos homens e mulheres que sonham com um Chile mais justo e democrático, confirmando as palavras do presidente socialista Salvador Allende, no último discurso antes de sua morte, a 11 de setembro de 1973.
“Trabalhadores de minha pátria, tenho fé no Chile e em seu destino. Superarão outros homens este momento cinzento e amargo em que a traição pretende impor-se. Saibam que, antes do que se pensa, de novo se abrirão as grandes alamedas por onde passará o homem livre, para construir uma sociedade melhor”, discursou Allende, pela rádio Magallanes, enquanto os militares golpistas bombardeavam o Palácio de La Moneda.
Com o resultado do plebiscito, os chilenos dão um passo histórico para enterrar a última herança do regime que, entre os anos de 1970-1990, impôs políticas liberais de mercado inspiradas na Escola de Chicago, a custa das liberdades e dos direitos humanos.
Os 17 anos do governo Pinochet deixaram um saldo de mais de 40 mil vítimas, entre elas 3.225 mortos ou desaparecidos, de acordo com o relatório da Comissão Valech. Grupos de vítimas estimam que a cifra supera os 100 mil. Na economia, o regime militar aplicou medidas radicais de venda de estatais, arrocho salarial, eliminação de impostos de importação, cortes nos gastos públicos, e isso resultou, ao final, no quadro de profunda crise social que vemos hoje.
Novo caminho
O processo constituinte é um caminho que se abre, por força da mobilização popular iniciada há um ano, e que deve canalizar o descontentamento de ampla maioria dos chilenos com o modelo liberal que perdura desde Pinochet e que atualmente é representado pelo presidente Sebastián Piñera.
Na noite de domingo, já com resultados preliminares que apontavam para o processo constituinte, milhares de chilenos tomaram a região da Praça Itália, epicentro das concentrações em Santiago.
Mas há pouco tempo para festejar, pois já nesta segunda-feira, começa a disputa com vistas à eleição dos 155 convencionais, marcada para o próximo dia 11 de abril, em menos de seis meses. A constituinte chilena será a primeira do mundo a garantir uma conformação equitativa entre homens e mulheres, conquista do poderoso movimento feminista do país.
Após a eleição dos convencionais, a previsão é que em meados de maio de 2021, o presidente Piñera deve convocar a sessão de instalação da convenção.
Pelo cronograma, a instalação deve ocorrer em 15 dias, ou seja, entre maio e o início de junho de 2021. Depois, em sua primeira sessão, a convenção deve eleger a presidência e a vice-presidência. Só aí terá início um prazo de nove meses para redigir e aprovar o texto constitucional que deverá ser ratificado em novo plebiscito, desta vez de caráter obrigatório. Esse prazo de nove meses pode ser prorrogado, apenas uma vez, por três meses.
O novo texto constitucional deve estar finalizado até o início de junho de 2022, quando um novo presidente estará governando o Chile.