A deputada Lídice da Mata (PSB-BA) e outras nove parlamentares progressistas enviaram uma carta à Organização das Nações Unidas (ONU) com denúncia contra portaria do Ministério da Saúde que impõe obstáculos para que mulheres vítimas de estupro abortem.
A carta com “apelo urgente” foi enviada a Michelle Bachelet, alta comissária da ONU para Direitos Humanos, a Dubravka Simonovic, relatora da ONU sobre violência contra mulher, a Tlaleng Mofokeng, relatora da ONU para o direito à saúde, e ao Grupo de Trabalho da ONU sobre a discriminação contra a mulher.
A portaria prevê que, na fase de exames, a equipe médica informe à vítima de violência sexual sobre a possibilidade de visualização do feto ou embrião por meio de ultrassonografia. Caso a gestante deseje ver o feto, ela deverá proferir expressamente sua concordância, de forma documentada.
A equipe médica também deverá comunicar o caso à autoridade policial, independentemente da vontade da vítima de registrar queixa ou identificar o agressor. No termo de consentimento, a gestante terá que relatar, com pormenores, a violência sexual sofrida.
A portaria prevê, ainda, que a gestante será informada da previsão legal dos crimes de aborto e falsidade ideológica, caso não se comprove que ela foi vítima de violência sexual e/ou estupro.
Para as parlamentares, as novas regras dificultam a realização do aborto legal e gera constrangimento e violência psicológica à mulher. “Além de ignorar os procedimentos especiais que protegem a audição de crianças e adolescentes, estas determinações trazem uma perspectiva policial adequada aos hospitais e forçam as vítimas a reexperiência forçada de eventos traumáticos para pessoal indevidamente qualificado em um momento muito sensível”, denunciam.
“Como se não fosse suficiente, a portaria também promove violência psicológica profunda, estabelecendo que a equipe médica deve encorajar a vítima de estupro a visualizar o feto ou embrião via ultra-som”, relatam.
As deputadas criticam ainda que, em vez de criar um ambiente seguro e acolhedor para o aborto legal, a Portaria do Ministério da Saúde dificulta o acesso de mulheres e meninas a este direito estabelecido, colocando em risco a vida de milhares de mulheres, especialmente as negras e pobres. “Ela apenas aumentará os casos não relatados e levará a procedimentos de aborto mais inseguros”, alertam.
A parlamentares pedem que a entidade organize uma visita de emergência ao Brasil do Grupo de Trabalho da ONU sobre discriminação contra mulheres e meninas e dos Relatores Especiais da ONU sobre violência contra mulheres. O grupo ainda solicita que a ONU faça uma declaração pública e que solicita ao Itamaraty que se explique diante das violações descritas.
A portaria do Ministério da Saúde foi publicada em meio a polêmica gerada pelo caso da menina de 10 anos que engravidou depois de ser estuprada pelo tio de 33 anos, no Espírito Santo.
A vítima precisou viajar para Recife (PE) para interromper a gestação e, junto com médicos, foi alvo de ataques de grupos religiosos e de extremistas contrários ao aborto.
De acordo com dados oficiais, em 2019, 4 meninas menores de 13 anos são estupradas a cada hora no Brasil. Em 2018, as meninas menores de 13 anos representavam 53,8% dos 66 mil casos de estupro oficialmente registrados no país, afirmam. Em 2019, o número de estupros cresceu 4,1%, atingindo uma média de 180 casos por dia.
Desde 1940, a legislação brasileira permite a interrupção da gravidez em caso de estupro.
Com informações do UOL e do G1