Uma em cada dez mulheres tem endometriose durante seus anos reprodutivos. No mundo, são 176 milhões acometidas pela doença que, de acordo com especialistas na área, tornou-se um dos principais problemas de saúde pública em ginecologia. No Brasil já são seis milhões de mulheres, e para muitas delas a consequência é a infertilidade.
Apontados no recente Estudo Global da Saúde das Mulheres, realizado pelo Departamento de Saúde Pública da Universidade de Oxford, Reino Unido, estes números estimularam a Liderança do Partido Socialista Brasileiro na Câmara dos Deputados a colocar o tema em pauta na Casa. Por meio da deputada Sandra Rosado (PSB-RN), a legenda promoveu, nesta terça-feira (dia 27), o Seminário “O Que é a Endometriose?"
Ao abrir o ciclo de palestras, a deputada Rosado alertou sobre a falta de políticas públicas de prevenção. “Nosso objetivo é salientar a importância do trabalho conjunto entre os órgãos gestores e o Parlamento, no que diz respeito ao avanço da legislação de apoio ao trabalho de combate à endometriose”, destacou a socialista.
ÔNUS — O impacto econômico da doença, que se caracteriza pela presença do endométrio fora do útero, é alto. Calcula-se que o custo anual por paciente chegue a EUR 10 mil, ou cerca de R$ 30 mil, sendo tão alto quanto o custo anual por paciente de diabetes mellitus e artrite reumatoide.
Para o cálculo destes valores são levados em consideração os gastos com hospitalização, medicamentos, cirurgias, exames e, um dos fatores de maior peso, o prejuízo econômico devido à perda de produtividade no trabalho das mulheres afetadas pela doença.
Em sua palestra, o presidente da Sociedade Brasileira de Endometriose, Professor Doutor Maurício Abrão, destacou o fato de a endometriose ser uma das principais causas de falta ao trabalho e de queda de produtividade femininas. “As cólicas podem ser tão fortes que se tornam incapacitantes”.
Ele citou que o tempo médio para que se chegue ao diagnóstico é de sete anos, o que, no caso de uma doença progressiva, dificulta o tratamento, agrava as consequências e reduz as chances de cura. “Em média, as pacientes precisam visitar sete médicos diferentes até que o último conclua que o caso é de endometriose”, disse.
DESCONHECIMENTO — O diagnóstico tardio é fruto, principalmente, de desinformação. Pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Endometriose e Ginecologia Minimamente Invasiva (SBE) com 5.000 mulheres acima de 18 anos em todo o País, aponta que a maioria (55%) não sabe o que é endometriose. O estudo mostra ainda que 66% das entrevistadas não conseguiram identificar a que sintomas a doença está associada.
Apesar da gravidade e do grande número de mulheres que sofrem com este mal, há falta de profissionais capacitados para diagnosticar e tratar o problema. O palestrante Alysson Zanata, doutor em medicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, afirmou que a doença é conhecida como “a mestre dos disfarces”, porque pode se apresentar de várias formas, ou simplesmente permanecer silenciosa, já que o principal sintoma, as cólicas femininas, é “socialmente aceito e considerado normal”.
O especialista reitera que é preciso acabar com este mito. “É necessário capacitar os médicos para que fiquem atentos, principalmente, às queixas das adolescentes, já que cólica forte, incapacitante, que acomete quase 70% das adolescentes, não é normal”.
CONHECIMENTO— Ainda não se descobriu com exatidão a causa da endometriose, o que dificulta a prevenção e também o diagnóstico, que hoje é feito principalmente por imagens. Os resultados, porém, estão “diretamente ligados ao nível de conhecimento do examinador”, explicou Luciano Gibran, diretor do Núcleo de Endoscopia Ginecológica e Endometriose do Centro de Referência da Saúde da Mulher do Hospital Pérola Byington, de São Paulo.
Ele contou que é comum o laudo de exames apontar um quadro de normalidade mesmo quando já há uma lesão grave no tecido examinado. “Quem não sabe o que procura, quando acha não encontra”, citou Gibran.
Outro palestrante, Dr. Frederico José Silva Corrêa, professor supervisor do Programa de Residência Médica em Reprodução Humana do Hospital Regional da Asa Sul do Distrito Federal, lembrou também que há estados no Brasil onde nenhuma equipe é capacitada para realizar as cirurgias necessárias para a remoção completa do tecido lesado.
Consideradas de alta complexidade, pois podem envolver vários órgãos e por isso demandar especialistas de diferentes áreas médicas, estas cirurgias muitas vezes representam a única possibilidade de tratamento. “As cirurgias que cauterizam apenas focos de endometriose nada mais são do que paliativos, já que é comum a doença ressurgir em outros locais em pouco tempo”, explicou.
O QUE É — Endométrio é o tecido que reveste a cavidade do útero, preparando-o para receber o embrião. Quando não ocorre fecundação, este tecido se descama e é eliminado através da menstruação.
Na endometriose, porém, este tecido se implanta fora do útero, migrando, através da corrente sanguínea, para órgãos como ovários, ligamentos pélvicos, intestinos, bexiga, apêndice e vagina.
Há quatro classificações de endometriose: peritoneal, ovariana, profunda infiltrativa (a mais grave) e extra pélvica, esta mais rara, em casos em que o tecido pode ser encontrado em órgãos distantes, como pulmão, pleura e sistema nervoso central.
A doença pode causar dores intensas no período menstrual, além de dores durante as relações sexuais, dificuldade de engravidar e infertilidade. Mas a endometriose também pode levar à morte, pois, em algumas situações, pode levar ao comprometimento das atividades de órgãos vitais como o intestino e os rins.
FRENTE — Além de debates e palestras sobre a doença, na ocasião também houve o lançamento da Frente Parlamentar da Luta contra a Endometriose, da qual é presidente o deputado Roberto de Lucena (PV-SP). “Estamos comprometidos com a busca de soluções junto ao Poder Público”, afirmou o deputado. Os principais objetivos da Frente são dirimir a falta de profissionais capacitados, e cobrar do governo a estruturação de novos centros de excelência no tratamento da doença.
Também participaram do seminário os deputados socialistas Dr. Ubiali (SP), Glauber Braga (RJ e Isaías Silvestre (MG).