Pela primeira vez na história do Brasil, partidos de Esquerda reuniram-se para discutir uma política integrada de Defesa Nacional. O seminário Política de Defesa e Projeto Nacional de Desenvolvimento, realizado pelas Fundações João Mangabeira (PSB), Perseu Abramo (PT), Maurício Grabois (PCdoB) e Leonel Brizola – Alberto Pasqualini (PDT), reuniu, nesta segunda-feira (4), no auditório da Escola Legislativa da Câmara dos Deputados em Brasília, sociedade civil, políticos e militares.
O objetivo do evento serviu para aprofundar as discussões sobre as distintas políticas de Defesa Nacional como as áreas nuclear, aeroespacial e cibernética, visando à manutenção da Soberania Nacional e o desenvolvimento do Brasil.
O ministro da Defesa, Celso Amorim, fez o discurso de abertura no painel “Defesa e o Cenário Internacional”. Segundo ele, o debate foi de suma importância já que a estratégia Nacional de Defesa está sendo revisada e o Brasil prepara um “Livro Branco de Defesa Nacional” que mostrará a visão dos governantes acerca dos cenários em que se inserem os esforços para proteger o país.
“Com a nova visão que o Brasil assumiu no mundo, há uma consciência crescente entre políticos, sociedade e governo de que o País tem que zelar pelos seus recursos, pelas suas capacidades. Defesa, por definição, é algo indelegável, e o Brasil tem que se preparar para cumprir”, afirmou Amorim.
O vice-presidente Nacional do Partido Socialista Brasileiro (PSB), Roberto Amaral, esteve presente na reunião e participou das mesas “Estratégia Nacional de Defesa” e “Projetos Estratégicos de Defesa: Aeroespacial”.
“É dramática a fragilidade de nossas Forças Armadas, mas também é impossível pensar em políticas de defesa limitando-se ao ponto de vista militar. Essa política se fundamenta, antes de tudo, em elementos culturais e ideológicos e depende da adesão da cidadania”, afirmou.
O presidente da Fundação João Mangabeira (FJM) e primeiro secretário Nacional do PSB, Carlos Siqueira, afirmou que o desenvolvimento de um país depende da Defesa Nacional e, para isso, é preciso pensar em planos estratégicos. “O debate sobre a Defesa Nacional, feito pela Esquerda e incluindo a presença de vários militares é um passo importante para o Brasil. Inaugura um novo momento e requer que nós não tenhamos nenhum preconceito na discussão desse tema”, ressaltou.
Participaram ainda os presidentes das Fundações Perseu Abramo, Nilmário Miranda, e Maurício Grabois, Adalberto Monteiro; o secretério-geral do PT, Elói Peitá; o presidente do PCdoB, Renato Rabelo; o jornalista e analista político, Francisco das Chagas Leite Filho (representando o PDT); e o assessor especial do Ministério da Defesa, José Genoíno.
Programa Aeroespacial
O vice-presidente Nacional do PSB, Roberto Amaral, e o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antônio Raupp, foram os expositores do tema sobre o Programa Aeroespacial Brasileiro.
Para Amaral, este é um dos principais desafios estratégicos do século, em face do papel desempenhado pelo sistema satelital na vida moderna.
Atualmente, todas as grandes potências e as que têm expectativas de se tornar uma nos próximos 50 anos, dispõe de programa espacial avançado. “O Brasil é a teimosa exceção. Não basta identificar os melhores parceiros para transferência de tecnologia. Se não tivermos capacidade de lançar, do solo brasileiro, com foguete brasileiro, nossos satélites, não teremos condições de garantir a soberania de nosso país”, afirmou o vice-presidente do PSB, ressaltando que o tempo perdido não é recuperável. “O Estado exige verticalidade e continuidade. Há trinta anos que o projeto do VLS (Veículo Lançador de Satélites) é esperado, e a tecnologia não espera os retardatários – ela avança”.
Roberto Amaral explicou que o Brasil possui a melhor localização do mundo para o lançamento de satélites . “Nós reduziríamos 30% de combustível ou teríamos mais 30% de carga. Além de seguro, é comercialmente valorizado. Nenhum país tem um centro lançador de satélites como o da Base de Alcântara”.
O ministro Marco Antônio Raupp, afirmou que é necessária maior integração entre as instituições que compõem o sistema espacial no país e que é preciso transformar a gestão do programa para avançar. “O panorama histórico espacial remete à base da perspectiva. É preciso redirecionar práticas históricas para ter sucesso no futuro”, disse. “Existem algumas transformações na maneira de operacionalizar que são fundamentais, e uma delas é o protagonismo das empresas brasileiras”, concluiu.
Segundo o ministro, os últimos governos têm apoiado decisivamente a questão das pesquisas e do desenvolvimento tecnológico das Forças Armadas. “Nós financiamos R$ 1,5 bilhão nos últimos anos”.
Programa Nuclear
Os expositores do Programa Nuclear Brasileiro, Othon Luiz Pinheiro da Silva – presidente da Eletronuclear, e Rex Nazaré – físico e especialista em energia nuclear, foram unanimes ao dizer que é preciso avançar nas tecnologias de defesa.
Para o presidente da Eletronuclear, os mecanismos de decisão para a defesa nacional como o submarino nuclear devem ser em nível nacional. “Ou mudamos a estrutura de defesa ou não teremos um sistema de defesa no Brasil. O submarino nuclear é necessário para defender a costa brasileira”, argumentou Othon, lembrando que com a descoberta do pré-sal o projeto de defesa na área nuclear tornou-se ainda mais urgente.
O físico Rex Nazaré alertou para o consumo de energia no mundo. Segundo ele, todas as fontes energéticas serão necessárias. “O Brasil tem uma grande vantagem, porque nós temos todos os tipos de energia, como por exemplo: solar, eólica, nuclear, hidroelétrica, carvão vegetal, marés, lenha etc. No entanto, precisamos de projetos estratégicos de defesa e, para isso, é necessário independência, recursos humanos, segurança e técnica, e fiscalização educativa”. Rex Nazaré disse ainda que é papel do Estado o domínio da tecnologia, os recursos humanos e a integração entre sociedade e os poderes da República.
Programa de Defesa Cibernética
O Comandante do Centro de Defesa Cibernética (CDCiber), General de Divisão José Carlos dos Santos, explicou, durante a exposição sobre defesa cibernética, que o CDCiber é um órgão novo do Exército. O órgão foi implantado porque, com a Estratégia Nacional de Defesa, os setores cibernético, nuclear e aeroespacial foram colocados no mesmo patamar de importância estratégica para o país.
Segundo ele, apesar da defesa cibernética ter sido implantada no Brasil há pouco tempo, o centro já está em pleno funcionamento, e fará sua estreia na Rio+20, a Conferência da ONU para Desenvolvimento Sustentado. “Nós estamos colaborando na especificação de requisitos de segurança, exercendo uma coordenação dos órgãos. Sob a coordenação nossa, temos o Serpro, a Polícia Federal, órgãos estaduais e municipais. É a nossa primeira experiência real, de colaboração com uma agência civil, no caso específico o MRE, responsável pela organização da Rio+20. É um modelo”, explicou o general, ressaltando que o CDCiber já está se preparando para a Copa do Mundo em 2014 e para os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos – Rio 2016.
Já o pesquisador do IPEA – especialista em cibernética, Samuel César da Cruz Júnior, reforçou a necessidade de investimentos para a estruturação da defesa cibernética. Segundo ele, não existe hoje, no Brasil, infraestrutura cibernética totalmente segura. “O Brasil hoje é alvo no mundo. O projeto cibernético está em uma fase muito inicial e é uma solução necessária para o País. Se não estivermos seguros, colocaremos em risco outros programas, como o nuclear e o espacial. Se não estivermos seguros, em um estalar de dedos, estaremos a mercê de ataques cibernéticos de ativistas”, afirmou o pesquisador.
O pesquisador reassaltou ainda a importância de uma maior integração entre academia, sociedade civil e militares.
Estratégia Nacional de Defesa
O Decreto nº 6.703/2008 que aprova a Estratégia Nacional de Defesa é de grande interesse em todos os setores da sociedade brasileira. Por ser um país pacífico por tradição e convicção, o Brasil rege suas relações internacionais pelos princípios constitucionais da não intervenção, manutenção da paz e solução pacífica dos conflitos.
Porém, se o Brasil quiser ocupar o lugar que lhe cabe no mundo, precisará estar preparado para defender-se não somente das agressões, mas também das ameaças. “As Forças Armadas, aptas no ponto de vista tecnológico deverão ser concedidas a partir da vontade nacional em sua missão do projeto estratégico coletivo. Os valores nacionais são oferecidos pela sua formação de seu país, cultura e história”, alertou Roberto Amaral.
Livro
O Presidente da FJM, Carlos Siqueira, destacou a participação de militares, pesquisadores, parlamentares e ministros no Seminário “Política de Defesa e Projeto Nacional de Desenvolvimento”.
“Superou a expectativa de todos pela discussão em alto nível, a franqueza com que todos os expositores trataram do tema e, sobretudo, a sintonia no que é essencial sobre os diferentes temas: nuclear, defesa cibernética e aeroespacial”, avaliou o socialista
De acordo com Carlos Siqueira, os temas debatidos e as conclusões do seminário serão publicados em um livro, lançado pelas fundações João Mangabeira (PSB), Perseu Abramo (PT), Maurício Grabois (PCdoB) e Leonel Brizola – Alberto Pasqualini (PDT).
O Seminário “Política de Defesa e Projeto Nacional de Desenvolvimento”, foi transmitido ao vivo pela TV João Mangabeira e pode ser acessado aqui.