O deputado federal Heitor Schuch (PSB-RS) criticou nesta quinta-feira (19), na tribuna da Câmara dos Deputados, a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), uma das medidas da reforma ministerial anunciada pelo governo do presidente interino, Michel Temer. A pasta foi incorporada ao Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário.
“Extinguir o Ministério do Desenvolvimento Agrário é reduzir a importância desse segmento que é responsável por 70% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros. Na condição de Presidente da Frente Parlamentar Mista da Agricultura Familiar, faço um apelo para que o governo reveja sua decisão”, afirmou o socialista.
Na opinião do deputado, a extinção da pasta representa um retrocesso nas políticas públicas do setor. “O fechamento do MDA e sua incorporação a outro ministério implicará no atraso do desenvolvimento de agricultores familiares com prejuízos graves no processo de sucessão rural, podendo num futuro não muito distante comprometer a soberania alimentar do nosso país, além do risco de acarretar na expulsão de pessoas do campo aumentando o já preocupante índice de desemprego”, declarou.
O socialista também criticou os cortes nos programas sociais e defendeu uma auditoria na dívida pública. “É urgente que esta Casa cumpra dispositivo constitucional e inicie imediatamente uma auditoria da dívida pública para sabermos o que devemos, para quem devemos e o que gerou esta dívida, e os benefícios que a mesma trouxa para a sociedade como um todo", afirmou. "Os debates e as tratativas para cortar programas sociais, de pesquisa e de desenvolvimento, são mesmo que cortar migalhas, só que migalhas estas que são vitais tanto para o povo brasileiro quanto para o desenvolvimento deste país”, declarou.
Confira a íntegra do discurso do deputado:
Senhor presidente, senhoras e senhores parlamentares, público que nos acompanha através dos meios de comunicação desta Casa.
Quero iniciar agradecendo a cedência deste espaço ao deputado Luís Lauro do PSB, o que está me possibilitando proferir o meu primeiro grande expediente nestes quase quatorze meses de mandato como deputado.
Esse grande expediente versará sobre o tema DIVIDA PÚBLICA E REFORMA MINISTERIAL.
Somos um país de enormes potencialidades, com 366 milhões de hectares de terra agricultáveis, 8,5 milhões de quilômetros quadrados de área, 3,5 milhões de km de costa marítima, a maior floresta tropical úmida e uma das biodiversidades mais ricas do planeta, 13% do total das reservas de água doce do mundo, um parque industrial consolidado, alcançamos o posto de sexta maior economia do mundo, pouco sofremos os fenômenos da natureza, como vulcões, terremotos, maremotos. Na agricultura somos o celeiro do mundo, fornecendo alimentos para boa parte da população mundial e temos espaço para crescer ainda mais no processo de produção, e principalmente temos um povo que em sua imensa maioria é trabalhador, solidário e muito criativo.
Entretanto, sempre que uma crise econômica se apresenta, e elas ocorrem periodicamente, acontece uma tentativa, e muito vezes se pratica isso, de passar a conta para o conjunto dos trabalhadores pagar. E uma das formas de fazer isso é cortando os programas sociais, os gastos com saúde e educação, com o funcionalismo público, com os programas de incentivo, como os destinados à agricultura familiar e até as aposentadorias, que são, na sua grande maioria, de apenas um salário mínimo e destinadas a pessoas que deram toda uma vida de trabalho e de contribuição, seja ela direta ou indireta, para na velhice ter direito a este benefício.
Como já disse nesta tribuna em outra oportunidade. As propostas para resolver a crise são quase sempre as mesmas, sem nenhuma criatividade, optando-se pelo mais fácil que é cortar recursos dos programas destinados a pesquisa, ao desenvolvimento, ao atendimento das pessoas que não tem conseguido se inserir no atual modelo econômico, que como falei, atravessa mais uma de suas crises cíclicas que são intrínsecas ao modelo, chegando-se ao extremo de cortar recursos de quem produz, como os setores industrial e a agricultura, e em especial a agricultura familiar, que responde por parcela significativa dos alimentos que vão a mesa do povo brasileiro.
Volto a enfatizar, nenhum dos últimos governos, e muito menos a maioria desta Casa legislativa, com raras exceções, ousam tratar, e muito menos discutir os pesados juros pagos e os serviços da dívida pública da União, que esmaga o desenvolvimento deste país.
Não é admissível que comprometamos, conforme os dados que têm sido disponibilizados pela Auditoria Cidadã, 45,11% do orçamento da União com o pagamento destes juros que sequer sabemos sobre que tipo de dívida estão sendo pagos e nem para quem estamos pagando.
Esta Casa não pode continuar dando os ombros a essa excrecência, que é esta dívida quase impagável, que se avoluma mês após mês. Os debates e as tratativas para cortar programas sociais, de pesquisa e de desenvolvimento, são mesmo que cortar migalhas, só que migalhas estas que são vitais tanto para o povo brasileiro quanto para o desenvolvimento deste país.
Além do debate da dívida pública que precisa ser feito por este parlamento, é preciso também que o governo se posicione e aja sobre os escorchantes juros cobrados pelo nosso sistema financeiro, que tem feito reféns milhões de brasileiros que tem dívidas bancárias, o mesmo vem ocorrendo com milhares de pequenos negócios que são inviabilizados pelos juros cobrados quando têm que recorrer às instituições financeiras para honrar compromissos ou para uso como capital de giro necessário. As altas taxas de juros estão inviabilizando negócios e dificultando o acesso ao crédito, que é importante para a retomada do crescimento e para a geração de empregos.
Portanto, reafirmo aqui que é urgente, que esta Casa cumpra dispositivo constitucional e inicie imediatamente uma auditoria da dívida pública, para sabermos o que devemos, para quem devemos e o que gerou esta dívida, e os benefícios que a mesma trouxa para a sociedade como um todo.
O Governo Temer, que assumiu a Presidência da República em função do impedimento imposto à presidente Dilma, começa muito mal ao propor a esta Casa a extinção de um ministério que é de vital importância, não só para a agricultura familiar, mas para a população como um todo.
Extinguir o Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA não é reduzir a importância desse segmento que é responsável por 70% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros. Na condição de Presidente da Frente Parlamentar Mista da Agricultura Familiar, que reúne 242 deputados e 6 senadores, e faço um apelo para que o governo reveja sua decisão de fundir o MDA com o Ministério do Desenvolvimento Social.
O Ministério do Desenvolvimento Agrário foi constituído em janeiro de 2000, durante o Governo Fernando Henrique Cardoso, atendendo uma reivindicação histórica dos micro e pequenos agricultores e suas entidades representativas, pelo fato de não se encontrarem representados e nem terem as suas demandas atendidas pelo Ministério da Agricultura. Portanto, uma conquista histórica.
Existem no Brasil, 4,3 milhões de famílias que representam 83% do total de famílias residentes no meio rural, que mesmo ocupando apenas 24% da área de terra agricultável são os responsáveis pela produção da maior parte dos nossos alimentos, com destaque para a produção de hortifrutigranjeiros, feijão, arroz, milho, carne, entre outros, e que dependem de políticas protetivas e estruturantes do Estado para que possam continuar no processo de produção, gerando emprego e renda, e também pela dimensão deste contingente de população tanto em número de pessoas quando pela sua capacidade de geração de emprego e renda. Sim, nada menos que 14 milhões de pessoas tem sua ocupação hoje no Brasil relacionada à agricultura familiar, que responde por 38% do valor bruto da produção do país.
Entre os avanços obtidos nesses anos todos, com a intervenção direta do Ministério do Desenvolvimento Agrário, está a consolidação do conceito de Agricultura Familiar, em substituição a antigas citações inapropriadas como micro ou pequenos produtores, entre outros, e a constituição de um conjunto de programas estruturantes deste segmento da agricultura como a consolidação do Programa Nacional do Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF, que tem sido instrumento de fortalecimento destes produtores e da sua inserção no processo de modernização da agricultura.
Portanto, o Fechamento do MDA e sua incorporação a outro ministério representará um retrocesso em todas as políticas públicas produzidas implementadas, e implicará no atraso do desenvolvimento deste contingente de agricultores familiares com prejuízos graves no processo de sucessão rural, podendo num futuro não muito distante comprometer a soberania alimentar do nosso país, além do risco de acarretar na expulsão de pessoas do campo aumentando o já preocupante índice de desemprego que afeta drasticamente as famílias deste país.
É preciso enxugar a máquina? Sim. É preciso tornar a estrutura mais administrativa mais eficiente? Sem dúvida. Mas não se pode começar cortando em setores fundamentais, que, pela sua grandiosidade e importância, pela sua própria natureza diferenciada, merece sim de uma pasta que cuide exclusivamente das suas políticas públicas e programas.
Outra preocupação, como já citei anteriormente, é a reforma da Previdência. Usando como argumento a necessidade de ajuste nas contas públicas o governo federal estuda a alteração das regras do sistema de aposentadoria no Brasil e mais uma vez quem deverá pagar a conta são os trabalhadores. Estabelecer uma idade mínima para se aposentar é uma das medidas apontadas, o que prejudicaria todos aqueles que começaram a trabalhar cedo. Acredito que é necessário sim corrigir distorções, tanto no setor privado quanto no público, mas não tirar de quem já tem tão pouco.
Volta e meia também é comum escutarmos que a aposentadoria rural é uma das responsáveis pelo rombo da previdência. O que é uma grande inverdade, porque os agricultores também contribuem e a injustiça praticada contra eles só foi corrigida com a Constituição de 1988 que reconhecei o direito ao benefício pelos homens e mulheres da roça, que até então amargavam uma velhice desprotegida, depois de uma vida inteira de trabalho duro.
Hoje podemos afirmar sem nenhuma dúvida que a aposentadoria rural é um dos principais programas de distribuição de renda do Brasil e não seria exagero dizer que, para a maioria dos municípios, esses proventos representam a maior fonte de renda da economia, além de contribuir para a manutenção das famílias no campo. Os prefeitos deste país afora sabem bem do que estou falando.
Enfim, é preciso que o governo tenha clareza e coragem para enfrentar a crise que assola o país sem lançar mão da solução mais fácil, que é o aumento de impostos e o corte de benefícios sociais, para sobrar mais dinheiro para o pagamento da dívida pública. Divida esta que precisa ser auditada, para que se possa estancar essa verdadeira sangria dos recursos, que impede o crescimento do país e atinge em cheio os trabalhadores e a camada mais pobre da população.