Criar uma legislação específica sobre as fake news e a regulação das plataformas e das redes, além de educar a população para um novo processo de comunicação nesses ambientes virtuais foram as principais pautas defendidas pela deputada federal Lídice da Mata (PSB-BA) durante a live “Janelas Temáticas”, na noite desta quinta-feira (20).
O debate foi promovido pelo PSB, PDT, Rede, PV, PCdoB e Cidadania. Participaram ainda a ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, o presidente nacional do PV, José Luiz Penna, o vice-presidente nacional do PDT, Ciro Gomes, e o deputado federal Orlando Silva (PCdoB).
A socialista, que é relatora da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News, destacou que o Brasil e a democracia estão sofrendo ameaças constantes de limitação das liberdades pelo atual governo autoritário. Por isso, defendeu que os partidos, os parlamentares no Congresso Nacional e a Justiça precisam ter instrumentos e mecanismos para se debruçar sobre as fake news e regular questões sobre esse tema para reverter a influência nas redes que a extrema-direita passou a ter no Brasil e no mundo.
“Não há uma bala de prata que possa impedir as fake news, mas essa prática precisa ser debatida, teremos que educar a população para um outro processo de ação dentro das redes, mas também teremos de ter uma lei que possa tornar esse processo mais transparente, que possa estabelecer também certas responsabilidades às plataformas, criar um conselho de autorregulação das plataformas e das redes”, pontuou.
A socialista explicou ainda o trabalho realizado pela CPMI que, desde sua criação em setembro de 2019, investiga a existência de grupos organizados para produção e difusão de notícias falsas por meio das redes sociais, sua influência no processo eleitoral de 2018 e no debate público atualmente. O colegiado averigua também a prática de cyberbullying contra autoridades e cidadãos vulneráveis e o aliciamento de crianças para o cometimento de crimes de ódio e suicídio.
“Nós, da CPMI, fizemos primeiro o exercício de buscar compreender o tema, fazendo audiências públicas com mais de 20 especialistas a respeito do assunto, desde a área de Comunicação, até juristas, representantes de empresas, técnicos de Tecnologia da Informação, para formatarmos uma opinião e conceitos semelhantes para iniciar a investigação propriamente dita”, disse.
Com a pandemia do novo coronavírus, as notícias falsas também vêm sendo difundidas em grande escala pelas plataformas virtuais causando a desinformação generalizada, colocando vidas em risco e prejudicando o combate à doença.
Um estudo feito pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), com conteúdos captados entre 17 de março e 10 de abril deste ano, mostrou que 65% das fake news envolviam curas caseiras milagrosas (sem qualquer comprovação científica) para a Covid-19; 5,7% eram sobre golpes bancários; 5% tratavam de falsos projetos para arrecadar recursos destinados à instituições de pesquisas; e 4,3% qualificavam a doença como uma manobra política.
No Brasil, o presidente Jair Bolsonaro defende o uso da cloroquina para tratar a doença, medicamento sem comprovação científica e que pode causar efeitos colaterais sérios quando usado indiscriminadamente.
Nos Estados Unidos, em abril, o presidente Donald Trump sugeriu que injeções de desinfetante promoveriam uma “limpeza interna” nos organismos das pessoas, ajudando a prevenir e a tratar a Covid-19. Nas 18 horas seguidas ao pronunciamento presidencial, a cidade de Nova York registrou mais que o dobro de ocorrências de intoxicação pelo produto do que o normal. Os serviços de emergência de todo o país também receberam inúmeras ligações para confirmar a informação dada por Trump.
De acordo com especialistas, a mistura de medo da doença com o vácuo de informação causado pelo fato de o vírus ser novo e com a contribuição de agentes públicos com a “pandemia da desinformação” cria um terreno fértil para a disseminação de fake news.
Dessa forma, Lídice destaca que a CPMI demonstra sua importância pelo fato de tornar público a discussão sobre as fake news no país. “Hoje, esse debate se torna indispensável justamente porque está comprovado que essas notícias falsas não são só uma ameaça à democracia, como também são uma ameaça à saúde pública e à vida das pessoas da sociedade brasileira”, afirma.
A deputada ainda citou a prisão do ex-estrategista de Donald Trump, nesta quinta-feira (20), sob acusações de desvio de centenas de milhares de dólares doados para a construção do muro que separaria os Estados Unidos do México. Steve Bannon, ideólogo da extrema-direita, é próximo da família Bolsonaro.
A campanha “Nós Construímos o Muro”, segundo a Procuradoria-geral de Nova York, teria arrecadado um total de US$ 25 milhões para erguer a promessa-chave da plataforma eleitoral anti-imigração de Trump.
“Ele que é o principal ‘mago’, organizador dessas ações da extrema-direita, no contexto internacional, ameaçando as democracias, acaba de ser preso. Ele também teve contato com a campanha de Jair Bolsonaro. Tudo isso vai se entrecruzando nesse momento em nosso país”, comentou Lídice, de forma que isso pode ter consequências no desdobramento das investigações da CPMI sobre as eleições de 2018 no Brasil.
Para finalizar, Lídice lembrou que países como França, Alemanha e Estados Unidos já estão legislando sobre fake news e punindo as plataformas e redes sociais e que o Brasil precisa de agilidade nesse sentido também.
“É preciso que o Congresso haja como intermediador e interlocutor desse conflito, temos que dar voz a essa indignação da sociedade com as fake news e a não-punição das plataforma. Não é uma questão de direita ou de esquerda, mas essas redes precisam sofrer algum tipo de advertência. Não se pode inventar sobre a biografia de alguém, nem usar empresas para massificar uma informação fraudulenta, por exemplo. Sobre isso, nós (Congresso) temos que intermediar de alguma maneira, seja em forma de negociação, de conversa permanente, de legislação para criar um ambiente de cordialidade nas redes”.