A Comissão de Direitos Humanos e Minorias realizou nesta quinta-feira (6), a pedido da deputada Keiko Ota (PSB-SP), audiência pública extraordinária para debater a instituição do Dia Nacional do Perdão.
"Esta audiência contribuirá muito para a promoção da paz, pois o perdão é um dos seus instrumentos mais importantes", afirmou Keiko. A deputada declarou estar emocionada e feliz com o evento e agradeceu a todos que se empenharam para sua realização.
Vítima de violência em 1997, quando seu filho Ives Ota foi sequestrado e assassinado aos oito anos de idade, a parlamentar buscou caminhos para não se perder no luto e na desesperança. Ela e o marido optaram, então por assumir o protagonismo social no combate à violência em todos os níveis da sociedade. “Da tristeza, fomos à ação ao fundarmos o Movimento pela Paz e Justiça Ives Ota, uma ONG sem sectarismo religioso que trabalha pela construção de uma sociedade pacífica.”, contou.
Em sua opinião, somente através do perdão a verdadeira paz se instala na vida. “O perdão proporciona a sensação de paz a quem foi prejudicado, pois quem perdoa torna-se sujeito da própria história e não apenas vítima da situação”.
Participaram da audiência, além dos deputados membros da Comissão de Direitos Humanos, José Carlos de Lucca, Juiz do Juizado Especial Cível e Membro do 5º Colégio Recursal da Comarca de São Paulo; Carlos Alberto da Silva, presidente nacional da Associação dos Jovens da Seicho No Ie do Brasil; e Geraldo Capetti Sobrinho, vice-presidente da Federação Espírita Brasileira.
JUSTIÇA — O juiz de Lucca procurou relacionar a importância da criação de um Dia Nacional do Perdão com o trabalho do Poder Judiciário no Brasil. “Uma cultura do perdão disseminada poderá resultar em efeitos práticos, diminuindo a violência social, a tramitação dos processos, pacificando conflitos”, explicou.
Ele citou dados do Conselho Nacional de Justiça, segundo os quais até 2012 havia 90 milhões de processos em andamento no Brasil, com estimativa de 26 milhões de processos novos a cada ano. De Lucca lembrou que, com apenas 800 mil advogados e 17 mil juízes, é uma luta quase desumana na qual a Justiça se sente impotente. Ele acredita que a quantidade de processos cresça à medida que os conflitos interpessoais se tornam mais frequentes.
O magistrado está convencido de que a cultura de perdão possa acelerar a tramitação dos processos na medida em que as partes passem a se restringir ao objeto da controvérsia na discussão de suas demandas. Ele explicou que, ao lado de questões relativas a batidas de carro, a serviços mal feitos, as pessoas trazem uma carga de ira e de vingança que dificulta a pacificação, o estabelecimento de acordos. “Inúmeras vezes ouvi, como juiz, a frase não quero acordo, porque quero ver o réu sofrer até o fim”.
Dessa forma, conflitos que poderiam ser resolvidos em poucos meses se arrastam por anos, criando um congestionamento da justiça brasileira, “que é pródiga em oferecer recursos para aqueles que não estão orientados para uma solução pacífica”, criticou.
FRATERNIDADE
De Lucca argumentou, ainda, que o estabelecimento de uma sociedade fraterna está no preâmbulo da Constituição Federal e poucos legisladores prestam atenção a isso. “A sociedade fraterna é um princípio, um valor supremo citado na nossa Constituição”, disse.
“É impossível estabelecer fraternidade num regime de hostilidade. O perdão é um substrato essencial para uma sociedade fraterna, que é uma meta que ainda não atingimos”, sentenciou.
Carlos Alberto da Silva, presidente nacional da Associação dos Jovens da Seicho No Ie do Brasil, também defendeu a iniciativa da deputada socialista Keiko Ota. “Não é apenas aquele que aprende o caminho do perdão que se liberta dos sentimentos negativos, pois a família inteira que é beneficiada. A origem de todo o mal está no lar desestruturado, por isso o perdão deve ser vivenciado dentro do lar”.
Vice-presidente da Federação Espírita Brasileira, Geraldo Capetti Sobrinho enfatizou que oato de perdoar descaracteriza o sentimento de vingança e não gera mais violência, tornando-se uma poderosa arma contra ela. “Perdoar é enxergar a boa parte da vida. Independentemente de crença, considerando a ética moral, falar de perdão é falar de caridade. E caridade é benevolência para com todos, indulgência”, resumiu.
CULPA
Todos os palestrantes reiteraram, no entanto, que o perdão não exime o ofensor da culpa pelo que fez. “Perdão é uma ferramenta que a vítima tem para avançar e continuar sua vida da melhor maneira possível, porém sem impedir que a justiça seja feita”, disse Keiko Ota.A deputada acrescentou que operdão pode conviver com a justiça, pois não impede que ela seja feita de forma adequada. “Ela apenas não é feita sob uma perspectiva rancorosa ou transtornada, mas de forma lúcida e crítica”.
O juiz de Lucca enfatizou ser um engano de muitos acharem que o dia do perdão será o dia da impunidade. “O perdão é para quem se sente ofendido, não para quem ofendeu”. O magistrado acredita que quem perdoa se sente em paz e age em paz. “Esse é o melhor presente que podemos oferecer à sociedade. Um homem sem conflito, em paz, não aperta um gatilho de uma arma, não dispara uma bomba nem começa uma guerra”.