Com profundo sentimento de respeito e pesar, solidário à dor de todo o povo francês e, em particular, àqueles tocados diretamente por um novo ato de barbárie, o Partido Socialista Brasileiro – PSB lamenta imensamente que, uma vez mais, o desejo de morte se oponha ao que conseguimos construir, mesmo que precariamente, como civilização.
Quanto a esse ponto, não pode haver dúvida alguma porque a mensagem é límpida e cristalina. Ao alvejar pessoas comuns, gente do povo, que celebrava a queda da Bastilha e, portanto, a superação de um mundo em que a distinção nobilitária andava a par com a desigualdade e a sujeição, os bárbaros proclamam seu desejo de submeter todos ao que acreditam ser o que há de mais nobre: o delírio de um “mundo purificado” das conquistas da modernidade. Repudiamos como socialistas esse mergulho no obscurantismo mais torpe, a tentativa insana de tentar restaurar diferentes ordens de medievalismo e a brutalidade que lhes tem caracterizado.
Na doença que acomete esses bárbaros, nada de pensamento livre, nada de autodeterminação, o mergulho puro e simples nas prescrições do fanatismo com verniz de religião; a sujeição das mulheres, dos que não se impõem pela violência, da alegria de se ser o que é. O atentado se realizou em 14 de julho, dia da queda da Bastilha, porque simbolicamente se dirige contra uma liberdade experimentada por seus perpetradores como insuportável.
É justamente isso que caracteriza atos desse gênero, como iniciativa a serviço da regressão, como patologia social: quem os executa são pessoas nas quais a necessidade de sujeição à autoridade, ao comportamento padrão, já operou de modo tão profundo, que simplesmente não podem conviver com qualquer diferença ou diversidade. Querem, ao fim, que todos sejam exatamente como eles, nem mais nem menos: escravos e servos de poderes hostis à vida! Encontram gozo profundo em destruir uma vida que não se permitem desfrutar, porque se renderam incondicionalmente à ideia de sua impureza.
Mas o que pode ser a vida humana, se não o próprio exercício da imperfeição e, com ela, dos encontros e desencontros, afetos e desafetos, todos eles reunidos sob a perspectiva de que nossas limitações e finitude exigem que dirijamos ao outro e a cada outro, o mais profundo sentimento de compaixão por uma condição que nos é comum?
Situações sombrias como estas a que bárbaros tentam submeter a França elevam a própria vida, naquilo que tem de corriqueiro – ir ao mercado, tomar o metrô, levar as crianças ao parque – à condição de ato de resistência política. O exercício dessa tarefa política, de continuar vivendo segundo os valores que fundamentam a sociedade ocidental, precisa encontrar parceiros em escala universal. O mundo que deseja se manter livre do fanatismo precisa abraçar Nice e carregar no peito, como própria, a dor imensa da violência de que foi vítima e a indignação que permitirá reagir altivamente a todas as manifestações de barbárie.
Viva a França, viva Nice, viva a vida que transita em cada um de nós e que não quer se render a qualquer forma de opressão.
Brasília-DF, 15 de julho de 2016.
Carlos Siqueira
Presidente Nacional do Partido Socialista Brasileiro-PSB