O jurista Dalmo Dallari declarou, nesta quarta-feira (14) que a PEC 215/00, que prevê que o Congresso dê a palavra final sobre a demarcação das terras indígenas e de áreas de conservação ambiental, é “escancaradamente inconstitucional”.
A afirmação foi feita durante audiência pública promovida pela Comissão de Legislação Participativa e pelo Grupo de Trabalho “Questão das Terras Indígenas”, criado no Abril Indígena pelo presidente da Câmara, após a ocupação do Plenário da Câmara pelos índios. 13 deputados e 10 índios integram o GT.
Do evento participaram autoridades ligadas aos direitos indígenas, além de parlamentares, como a deputada socialista Janete Capiberibe (AP), e representantes das comunidades indígenas. Cerca de 60 índios vindos da Bahia tocaram seus instrumentos tradicionais e entoaram palavras de ordem pedindo o arquivamento da PEC 215.
Dallari citou três aspectos que justificam sua avaliação: o primeiro é que a proposta do ex-deputado Almir Sá “afeta a regra fundamental da separação dos Poderes, ao transferir para o Legislativo uma atribuição administrativa típica do Executivo”; o segundo é que a PEC prevê que as terras indígenas só se tornariam inalienáveis após a ratificação da demarcação pelo Congresso, “quando, na verdade, a Constituição já diz que as terras indígenas são inalienáveis”. Por fim, a PEC também diz que as demarcações podem ser ratificadas “e isso fere a Constituição já que a demarcação, que cabe ao Executivo, é um ato administrativo e jurídico perfeito”.
Sob aplausos das lideranças indígenas, Dalmo Dallari afirmou que, se o Congresso aprovar a PEC, ele vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal para questionar a inconstitucionalidade da proposta.
ALERTA – A deputada Janete Capiberibe (PSB/AP) reafirmou a contrariedade à PEC 215 e sua inconstitucionalidade. Cobrou que os oito partidos (PSB, PT, PDT, PSDB, PSC, PSOL, PR e PCdoB) mantenham o compromisso assumido, de não indicar membros à Comissão Especial da PEC 215. Assim, a PEC seria arquivada.
Ela alertou para a ofensiva do agronegócio e da mineração, que põe em risco os direitos dos povos indígenas por meio de outras propostas como o Projeto de Lei 1610/1996, o Projeto de Lei Complementar 227/2012 e a PEC 237/2013. O primeiro, abre as terras indígenas para a mineração por não-índios; o segundo, abre as terras indígenas para qualquer atividades econômicas por não-índios ‘por interesse da União’; e o terceiro quer legalizar o arrendamento das terras da União ocupadas pelos índios para o agronegócio.
A socialista pretende transformar o GT em Conselho Permanente de Política Indigenista na Câmara dos Deputados, com poder de veto, tornando-o um mecanismo para que o parlamento ouça e respeite as opiniões dos povos indígenas no processo legislativo, conforme determina a Convenção 169, da OIT. As oitivas devem ser mais amplas do que apenas uma audiência pública e realizadas nas comunidades indígenas. Ela afirmou ainda que a FUNAI precisa ser fortalecida.
Também presente à audiência, o ex-presidente da FUNAI, Carlos Frederico Marés, afirmou que o direito à terra é originário dos povos indígenas e que a PEC 215 subverte esse conceito Constitucional. Ele fez questão de frisar que demarcação é um mero ato técnico, por isso não cabe ao Legislativo. Com isso, ele quis dizer que deputados e senadores não teriam competência técnica para tratar desse assunto.
Por sua vez, o secretário de assuntos legislativos do Ministério da Justiça, Marisvaldo Pereira, disse que a PEC não contribui para o atual processo comandado pelo ministério, no sentido de ampliar a transparência das demarcações por meio do diálogo e das soluções pacíficas. Ele afirmou que o Ministério da Justiça é contrário à proposta.