Autor: Flávio Dino, governador do Maranhão (PSB)
A reforma administrativa que o Brasil precisa não está em tramitação no Congresso
Tenho a honra de ser servidor público desde 1989, quando iniciei minha vida profissional. Desde então, passei pelos Três Poderes (Judiciário, Legislativo e Executivo), onde aprendi muito e convivi com excelentes profissionais. Com essas experiências de vida reforcei a visão de que servir ao público está na essência do que acredito como cristão. Jesus nos ensinou a servir aos que mais necessitam em toda a sua passagem terrena, por exemplo, quando lavou os pés de seus discípulos (Jó 13, 1-15). Ou quando pregou a Parábola do Bom Samaritano, fixando o paradigma da ética do serviço, assentado no amor e no respeito ao próximo.
Em hora tão difícil da história brasileira, precisamos de instituições fortes, que nos protejam dos desatinos dos perigosos extremistas atualmente no poder. Mas não podemos esquecer que as instituições são construídas por pessoas, que devem ser respeitadas e valorizadas. Tais pessoas, no caso os servidores, garantem a manutenção de políticas públicas nos termos da Constituição e das leis, executando diretrizes políticas legítimas. Em face de seu peculiar papel, possuem um regime jurídico próprio na maioria dos países do mundo. No Brasil, esse estatuto jurídico abrange a estabilidade dos vínculos funcionais, há muitas décadas, visando proteger o trabalho dos bons servidores, sem impedir a punição dos maus. Com efeito, não há dúvida de que o servidor negligente ou que comete ilegalidades deve ser punido, e o atual sistema não elimina essa possibilidade.
Importante frisar que a estabilidade funcional do servidor público, mediante concurso, foi inicialmente prevista na Constituição de 1934, na Era Vargas, como forma de proteger o Estado da interferência indevida de grupos políticos, perturbando a realização de serviços essenciais como saúde e educação. A premissa era de que os cidadãos devem ser tratados de forma isonômica, independentemente de sua preferência partidária, seguindo o princípio da impessoalidade, diferentemente dos padrões hegemônicos da chamada “República Velha”.
Daí se imagina o tamanho do retrocesso pretendido quando o governo tenta suprimir ou enfraquecer a estabilidade dos servidores. Pior, gastando 6 bilhões de reais em emendas, inclusive do “orçamento secreto”, para aprovar essa “reforma administrativa”. O nosso país precisa de uma reforma administrativa justa, que alcance os Três Poderes, aí incluídos os militares, banindo, de verdade, alguns privilégios, valorizando a eficiência e preservando direitos de quem merece. Neste caso, não há justificativa lógica para que haja um tratamento fatiado do serviço público, quebrando a coerência interna do nosso ordenamento jurídico.
A garantia de direitos, com tratamento impessoal e equânime a todos, materializa-se no trabalho de milhões de servidores públicos por todo o País. No Maranhão, temos valorizado esses profissionais, pela certeza que tenho de que eles são essenciais para o desenvolvimento da nação. Agora, em novembro, vamos adiantar o pagamento da segunda parcela do 13º salário, injetando mais de 300 milhões de reais na economia local. Havíamos adiantado a primeira parcela no mês de abril. Realizamos vários concursos e há cinco anos pagamos o maior salário de professor do Brasil, tanto no regime de 40 horas quanto naquele de 20 horas. Em setembro, inauguramos o novo Hospital dos Servidores do Estado, quitando uma dívida histórica e mostrando cuidado com os profissionais do serviço público maranhense. O novo hospital possui 104 leitos, UTI, centro cirúrgico e 34 salas para consultas e exames, com a atuação de 1,5 mil profissionais da saúde e apoio administrativo.
O legado que deixaremos de obras e serviços é construído pelas mãos e mentes de centenas de milhares de servidores públicos. Infelizmente, vivemos um período de crise nacional profunda, implicando limites para que ainda mais seja feito, uma vez que não podemos sacrificar a responsabilidade fiscal, sob pena de aumentar o caos produzido pelos desatinos federais. Mas seguimos na luta em defesa do serviço público, de modo contínuo e firme. A nossa pátria não pode se perder ainda mais nesta agenda equivocada de “reformas”, que depois cobram um imenso preço, como estamos vendo com a disparada dos combustíveis. A tal paridade de preços de importação é um exemplo de uma péssima reforma realizada em anos recentes.
Por ocasião do Dia do Servidor, em 28 de outubro, deixo meu agradecimento a todos os funcionários públicos que atuam em conjunto comigo, trabalhando todos os dias pela oferta de serviços que salvam e melhoram a vida do povo do Maranhão. A gratidão e a homenagem são extensivas a todos os servidores públicos da nossa nação.
* Artigo originalmente publicado na edição de nº 1.181 da Revista Carta Capital