
Hélia Scheppa/Governo do Estado de Pernambuco
Autor: Paulo Câmara, governador de Pernambuco desde 2015, reeleito em 2018
O novo cronograma da Ferrovia Transnordestina, proposto pela concessionária Transnordestina Logística (TLSA), prioriza a ligação entre a jazida de minério de ferro no Piauí e o porto de Pecém (CE), com conclusão em 2021. A retomada é uma boa notícia; porém, a chegada ao porto de Suape (PE) apenas no ano de 2027 é mais uma lamentável frustração nessa obra iniciada há mais de 20 anos –e sem motivos para tamanho atraso na frente pernambucana.
Suape fica 80 km mais próximo da jazida mencionada do que Pecém. Esses 80 km a mais de transporte ferroviário representariam algo em torno de R$ 50 milhões/ano adicionais de custo de transporte –ou R$ 500 milhões em valor presente. A logística não justifica esse atraso.
A explicação poderia residir no menor volume de investimento. Mas a obra está mais avançada em direção a Pernambuco. O trecho entre Salgueiro e Suape, com 544 km, tem 41% prontos e está mais avançado que o segmento Missão Velha a Pecém, que tem 527 km.
Outro argumento é que os lotes de chegada ao porto de Suape não teriam seus projetos aprovados na ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres). Entre 2012 e 2013, o traçado original da ferrovia precisou de variantes em virtude de uma barragem e de conflitos urbanos.
Essa revisão coube à própria empresa –e se arrasta há muito tempo. Segundo o TCU, a concessionária deve complementações de projetos e orçamentos na obra toda, e não só em Pernambuco, o que suscitou a suspensão de repasse federal até sua aprovação.
Resta, então, a questão portuária. Aqui, o caso é mais problemático. Suape é um Porto Organizado submetido a intensa regulação federal e listado no Sistema Federal de Viação. Pecém é um Terminal de Uso Privado, não sujeito à mesma sorte de controle federal e detentor de maior flexibilidade. Essa assimetria na regulação supõe que os portos organizados, mais controlados, sejam os destinatários dos investimentos da União, mas a proposta vai no sentido contrário.
Ainda que haja preferência por um modelo mais flexível para viabilizar a verticalização da cadeia logística, a União poderia transformar o Terminal de Minério de Suape num terminal privado, de modo a oferecer condições iguais aos dois ramais. Em vez disso, aprisiona-se Suape na burocrática legislação portuária e se propõe retirá-lo da prioridade dos investimentos federais.
Suape tem condições para receber a Transnordestina. É o quinto porto do país, o maior do Nordeste, lidera no Brasil a movimentação de líquidos e de cabotagem e, no Nordeste, a de contêineres. Já tem terminal para movimentar os grãos da região do Matopiba e, desde 2012, desenvolveu os projetos necessários à licitação do Terminal de Minério –licitação cuja responsabilidade desde a nova Lei dos Portos de 2013, e sob protestos de Pernambuco, é do governo federal.
Retornando-se ao início: não existem razões para que o governo federal aprove o cronograma proposto. É ótimo que se viabilizem as obras em direção a Pecém, mas não a postergação de uma ferrovia tão esperada em Pernambuco.
Defendemos que esta seja executada em direção a ambos os portos, e é preciso que se apresente uma solução nesse sentido, dialogando com os estados.
Espera-se que os órgãos que irão se debruçar sobre o tema tomem a decisão correta para que a retomada desse projeto, tão importante para o Brasil e para Pernambuco, não passe mais anos travada por decisões equivocadas.
* Artigo originalmente publicado no jornal Folha de São Paulo em 23/11/2018