O PSB, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e outros cinco partidos políticos da oposição (PSOL, PCdoB, Rede Sustentabilidade, PDT e PT) ingressaram com uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no Supremo Tribunal Federal (STF) para que a União seja obrigada a adotar medidas para conter e reduzir os efeitos da pandemia do novo coronavírus em comunidades indígenas isoladas.
Os autores querem que o STF determine que a Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH) desenvolva um plano voltado à proteção dos povos indígenas em relação ao avanço da Covid-19. Pedem ainda que esse plano, a ser apresentado no prazo máximo de 20 dias, seja formulado com o auxílio técnico da Fiocruz, e participação indígena de, no mínimo, seis representantes, sendo pelo menos três indicados pela Apib e pelo menos outros três pelos presidentes dos Conselhos Distritais de Saúde Indígena (CONDISIs).
Já em caráter liminar, pedem que seja determinado à União que tome imediatamente “todas as medidas necessárias para que sejam instaladas e mantidas barreiras sanitárias para proteção das terras indígenas em que estão localizados povos indígenas isolados e de recente contato”.
Outro pedido em caráter liminar é que a União providencie o efetivo e imediato funcionamento da “Sala de Situação para subsidiar a tomada de decisões dos gestores e a ação das equipes locais diante do estabelecimento de situações de contato, surtos ou epidemias envolvendo os Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato”, o qual deve necessariamente passar a contemplar, em sua composição, representantes do Ministério Público Federal, da Defensoria Pública da União e dos povos indígenas, estes indicados pela Apib.
Na petição são apontadas graves lesões a preceitos fundamentais da Constituição, relacionadas a falhas e omissões pelo governo no combate à Covid-19 entre essa população.
O documento aponta dados sobre como o coronavírus está afetando os povos indígenas, indicando até um possível extermínio de algumas etnias. Além disso, aborda um histórico de como doenças trazidas por brancos vêm impactando os povos indígenas desde a colonização.
De acordo com o Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena da Apib, até o dia 27 de junho deste ano, o Brasil registrava 378 indígenas mortos, 9166 infectados e 112 povos atingidos pelo vírus. Existe ainda grande discrepância entre esses números e os dados oficiais da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) devido às subnotificações de casos no âmbito do governo federal.
“A Sesai está contabilizando apenas os casos ocorridos dentro de terras indígenas, e, além disso, existem graves falhas e inaceitável morosidade na alimentação dos seus dados”, dizem os advogados na petição inicial.
Para a Articulação, a Sesai adotou o entendimento absolutamente discriminatório e inconstitucional de apenas prestar atendimento aos indígenas aldeados, que vivem em terras homologadas.
“Isso exclui tanto os índios que habitam terras em processo de demarcação – e convém lembrar que o governo paralisou todos os processos demarcatórios, cumprindo sua hedionda e inconstitucional promessa de campanha de não demarcar mais “nem um centímetro de terras indígenas” –, como também os que vivem em contexto urbano, mas que não se despem da sua identidade étnica por conta disso. É preciso afastar essa orientação, para proteger todos os indígenas brasileiros, especialmente no contexto da pandemia do COVID-19”, diz o documento.
A Apib e os partidos apontam que a taxa de mortalidade do vírus nos indígenas é maior do que na população geral. Com base nos dados da Apib, verifica-se que o índice de letalidade da Covid-19 entre povos indígenas é de 9,6%, enquanto que, entre a população brasileira em geral, é de 5,6%.
“Na verdade, o vírus está se alastrando com grande rapidez entre os povos indígenas. À medida que a epidemia se interioriza – como vem ocorrendo –, os números de contaminados e de óbitos tendem a aumentar drasticamente”, afirmam na ação.
De acordo com um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) citado pelos autores, dentre as terras indígenas com maior vulnerabilidade, figuram os territórios Yanomami e Vale do Javari, no oeste do Amazonas.
Os autores dizem que “lamentavelmente” o Estado brasileiro vem falhando gravemente no seu dever de proteger a saúde dos povos indígenas diante da COVID-19, “gerando o risco de extermínio de muitos grupos étnicos”.
“O governo federal vem agindo de maneira absolutamente irresponsável no controle da pandemia do coronavírus em relação aos povos indígenas. As ações e omissões do Poder Público estão causando um verdadeiro genocídio, podendo resultar no extermínio de etnias inteiras. Há grave violação de preceitos fundamentais da Constituição Federal, como os direitos à vida e à saúde, bem como o direito dos povos indígenas de viverem em seus territórios, de acordo com sua cultura, seus costumes e tradições. A gravidade ímpar do quadro e a dificuldade de enfrentá-lo evidenciam a necessidade de intervenção do Supremo Tribunal Federal, no desempenho da sua função maior de guardião da Constituição”, diz a petição inicial.
Para a Apib, o governo não é apenas omisso em proteger os povos indígenas, mas também contribui para incentivar ativamente invasões criminosas em terras indígenas, “que cresceram exponencialmente na gestão do presidente Jair Bolsonaro”.
Um desses incentivos, de acordo com a Articulação, seria a Instrução Normativa 09/2020 da Funai, que permite a exploração e a comercialização de terras indígenas que ainda não foram homologadas pelo presidente da República.
Aumento do desmatamento e da mineração
A ADPF ainda destaca o aumento exponencial do desmatamento e da mineração em terras indígenas a partir de 2018. Dados do PRODES, sistema do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – Inpe, revelam que, em 2019, a taxa anual de desmatamento (avaliada entre agosto de 2018 e julho de 2019) em toda a Amazônia foi de 34,41%, mas que esse incremento foi de 80% quando consideradas apenas as terras indígenas.
“Se, em condições normais, as invasões de terras indígenas demarcadas já constituem comportamentos ilícitos graves, que demandam a intervenção do Poder Público em favor dos direitos dos povos indígenas e da proteção ao meio ambiente, isso se torna ainda mais urgente no contexto da pandemia provocada pelo novo coronavírus”.
Na ação, os autores requerem ainda que a União tome as medidas necessárias para retirar invasores de terras indígenas, utilizando, se necessário, até as Forças Armadas.
Por fim, pedem que todos os indígenas do Brasil possam utilizar o Subsistema de Saúde Indígena do SUS inclusive os não aldeados (urbanos) ou que habitem áreas que ainda não foram definitivamente demarcadas.
Assessoria de Comunicação/PSB Nacional com informações do Portal Jota